Talvez você tenha passado pelo último sábado, dia 11 de março, de maneira alheia ao que a data representa. Ainda assim, conscientes ou não, ninguém escapou dos efeitos do acontecimento que se tornou o centro do dia.

Na ocasião, atingimos o marco de 3 anos de pandemia da covid-19, desde que a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou o estado de pandemia no globo.

Na época, a população mundial estava diante de um novo “status”, que certamente não detinha a capacidade total de alertar aos seres humanos das mudanças monumentais que estavam por vir.

Após três anos, é inegável que a sequência acelerada de mudanças gerou impacto que permanece entrelaçado à saúde mental de diferentes grupos e ao próprio modo o qual cada indivíduo se posiciona no mundo.

A discussão sobre o que essa série de mudanças gerou nas relações humanas e no próprio processo de autoconhecimento foi o tema central da discussão do episódio do Conexão Sagres: Quem somos nós após 3 anos de pandemia?, que contou com a presença da psicopedagoga Ana Paula Carvalho e a advogada e psicóloga Livia Baylão.

Inconstância: única certeza

Crianças, adolescentes, adultos, idosos, todos tiveram que se adaptar mesmo em meio a ausência de informações precisas. A psicopedagoga Ana Paula Carvalho relembra as diferentes fases emergidas na pandemia, como o momento de total isolamento, recomendado por especialistas da área da saúde, até os períodos onde os níveis de flexibilização eram variados de modo constante.

Para a especialista que acompanhou de perto as consequências na educação infantil, a mistura de contextos e responsabilidades emergiu grandes impactos.

“Chegou junto com tudo isso a ansiedade, a angústia dos pais, das crianças e aquele relacionamento conturbado dentro de casa. Era preciso trabalhar, conviver e trazer a escola pra dentro de casa”, relembra.

Diante desse cenário, não havia outra alternativa: era preciso se adaptar. Sobre isso, a advogada e psicóloga Livia Baylão defende a perspectiva de que em meio a tais mudanças, alguns ganhos merecem ser destacados.

“Não tem uma coisa que não tenha um lado positivo e outro negativo. Ainda que com decretos determinando que ficássemos em casa, nós tivemos que reaprender a lidar uns com os outros. Em contrapartida, para quem tinha essa disposição, foi um celeiro de oportunidades para nos desenvolver emocionalmente e interpessoalmente”, defende.

Transformação nos relacionamentos

De acordo com informações divulgadas pelo Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal (CNB/CF), em 2021, o Brasil alcançou o recorde em números de divórcios, com 80.573 registros.

Uma das suposições levantadas é a de que o intenso convívio exigido pelo isolamento social fez transparecer problemas que já estavam presentes antes de seu início.

“De repente, quem estava acostumado a viver uma vida de correria em que só se encontravam à noite, tiveram que lidar com ameaças, fraquezas e potencialidades que dificultam os relacionamentos”, afirma Ana Paula Carvalho.

Para além dos relacionamentos conjugais, a pandemia inaugurou novas formas de conexão e alterou de maneira significativa relações nos pequenos e grandes contextos, como amizades e relações no mercado de trabalho. Segundo Lívia Baylão, apesar das mudanças não serem lineares, todos foram impactados de alguma maneira.

“Alguma coisinha eu aposto que mudou. Às vezes não com tanta consciência, mas algo não tem como não ter mexido. Foi algo tão impactante nos nossos mais profundos conceitos de tudo. Temos mais pessoas com outro padrão de pensamento e postura”, destaca.

Espaço para o autoconhecimento

Na lista de atributos que foram mais intensamente desenvolvidos durante a pandemia, podem ser citados a capacidade de se colocar no lugar do outro, a adaptação ao incerto e até mesmo a valorização dos relacionamentos mais próximos ou, como muitos gostam de classificar, o contato “olho no olho”.

A partir do momento em que os lares se tornaram o ponto único de encontro com os outros e consigo mesmo, não havia mais espaço para atalhos ou fugas dos processos que exige o autoconhecimento como passo necessário.

“Os artifícios que eu usava para me desconectar dos incômodos, eu passei a não ter mais. Ficar com os nossos pensamentos é algo desafiador”, destaca Lívia Baylão.

No cenário onde uma grande maioria se viu conectada em vídeochamadas, lives e até mesmo festividades on-line, é possível perceber um outro tipo de desconexão: a que se dá consigo mesmo.

“As pessoas que fugiam de si, puderam continuar fugindo. Mas, quem se permitiu, teve um impulso e a oportunidade de criar mecanismos para olhar para si”, completa a advogada.

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