Os recursos naturais disponíveis no território de cada país favorecem ou dificultam a escolha para a composição da matriz elétrica. Neste contexto, o Brasil é exemplo mundial na produção de energia renovável, pois  cerca de 83% da matriz elétrica brasileira é composta por fontes renováveis. 

O dado citado acima é do Balanço Energético Nacional (BEN) de 2022, que detalha que 56,8% da energia elétrica produzida no país vem das usinas hidrelétricas. O mapeamento do BEN aponta que, em 2022, a fatia de oferta interna da produção energética também teve 10,6% da matriz Eólica, 8,2% da Biomassa e 2,47% da Solar.

O  doutor em Geografia e professor de Geociências do Centro Universitário Internacional UNINTER, Otacílio Lopes, afirmou que essa riqueza de matrizes elétricas renováveis deixa o país numa posição confortável.

“Estamos relativamente confortável porque temos essa matriz elétrica muito renovável. Tem muito recurso hídrico que a gente consegue utilizar para a geração de energia, temos hidrelétricas gigantescas a nível mundial. Temos uma matriz de energia solar interessante e eólica também. Já outros países não têm essas condições ambientais como a gente tem aqui, eles não vão ter grandes rios, então eles vão depender de outras fontes”, explicou.

Energia elétrica

Energia elétrica
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Uma das definições mais conhecidas sobre energia é que ela está associada à capacidade de produção de ação ou movimento. E isso pode ocorrer de diferentes formas, seja por calor, movimento de corpo ou pela eletricidade, entre outras possibilidades. Assim, já faz muito tempo que o ser humano produz energia elétrica por meio da queima do carvão mineral e do petróleo.

O professor Otacílio Lopes explicou que no caso da eletricidade, no entanto, a queima desses recursos é um processo que gera certos poluentes quando a energia elétrica está sendo gerada. Assim, disse ele, “o maior desafio que temos hoje é a conversão das fontes de energia que nós utilizamos”.

“Não tem como continuar usando esses recursos porque eles tem uma série de impactos ambientais que estão causando uma série de consequências aos equilíbrios dinâmicos do nosso planeta. E eles também estão por trás do aquecimento global. E também são recursos finitos e as estimativas dizem que eles vão acabar. Então nós temos praticamente uma gaiola em que a gente está se colocando e a saída para isso, então, é ir atrás de fontes renováveis”, contou.

Fontes

Plataforma de petróleo
Plataforma de petróleo (Foto: Pexels)

No artigo “Luz para o futuro: o exemplo brasileiro na produção de energia elétrica”, Lopes destaca que a produção de energia elétrica no mundo foi pautada no uso de recursos não renováveis. Assim, ele pontuou que o problema da questão é a liberação de poluentes e gases do efeito estufa na atmosfera. Essa emissão é uma das principais causas das mudanças climáticas.

Desta forma, o mundo produziu energia elétrica por muito tempo sem associar o uso desses recursos não renováveis com os impactos ambientais derivados de sua retirada em massa da natureza. “Somente na década de 1960, que pesquisadores começaram a analisar a relação entre o aumento da presença do dióxido de carbono (CO2) na atmosfera e o aumento da temperatura média global”, afirmou Lopes.

Após constatar a relação entre a emissão de dióxido de carbono e as mudanças climáticas, percebeu-se a necessidade do uso racional dos recursos naturais para produzir a energia elétrica. Assim, o uso sustentável desses recursos se tornou uma das pautas ambientais mais urgentes no mundo na década de 80. 

Em 1981, por exemplo, surgiu em Portugal a proposta de celebrar o Dia Mundial da Energia, em 29 de maio. Logo em seguida, muitos países adotaram a data, inclusive o Brasil. O objetivo é conscientizar a população em todo o mundo sobre o uso racional da energia elétrica. 

Acordo de Paris

Poluição
Poluição (Foto: Agência Brasil/Arquivo)

A partir da compreensão do aquecimento global os países começaram a se organizar em torno da questão ambiental. Surgiram, então, alguns acordos internacionais importantes como a Conferência sobre o Meio Ambiente Humano, em 5 de junho de 1972, em Estocolmo, na Suécia. Além, ainda, do Protocolo de Kyoto, assinado em 1997, durante a 3ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, em Kyoto, no Japão. 

O Protocolo de Kyoto, inclusive, é considerado o primeiro tratado internacional com o objetivo de controlar a emissão de gases de efeito estufa. Mas, o mais recente marco internacional com metas estabelecidas referente ao aquecimento global foi o Acordo de Paris, assinado por 195 países, em 2015.

“O Acordo de Paris vem como uma estratégia dos países de tentar frear as mudanças dessa emergência ambiental pela qual estamos passando. Porque essas mudanças ambientais não vão até a fronteira do país Y, ela avança por todo um continente e todo o planeta que nós nos encontramos”, explicou Otacílio Lopes.

As metas do Acordo são orientações sobre às emissões, por exemplo, das indústrias, veículos automotores e produção de energia. Sendo assim, as metas são para diminuir os impactos ambientais causados por essas atividades.

“O Acordo de Paris tem esse objetivo de que todo mundo coopere de forma conjunta para diminuir essa emissão de poluentes, do CO2 principalmente. Mas também, e concomitante a isso,  evitar o aumento da temperatura global que teria consequência para todo o mundo”, disse.

Geopolítica

Acordo de Paris
O futuro deve ser baseado em projetos de matriz elétrica limpa (Foto: WWF -Brasil)

O geógrafo Otacílio Lopes explicou que a questão energética do mundo está totalmente relacionada à geopolítica, portanto, a resolução do assunto depende das relações entre os países. Primeiro, para fechar acordos ambientais a nível global, como o Acordo de Paris.

“Para todos os países o desafio é transicionar para uma matriz mais verde. Por isso, [os países] têm apostado em outras fontes, como a geotérmica, a eólica, a solar e  já tem alguns estudos envolvendo hidrogênio. Então, para todo mundo é meio que uma corrida contra o tempo”, disse.

Um segundo ponto, segundo Lopes, é que essa mesma geopolítica tem “impulsionado” os países, principalmente os europeus, a uma corrida verde na matriz energética. Diferente do Brasil, diversos países do mundo não possuem muitas fontes de geração de energia renovável em seus territórios, o que dificulta a transição de suas matrizes energéticas.

“Um exemplo é a França, que não tem grandes rios, então ela tem que apostar em outras fontes de energia, como por exemplo a nuclear. E isso gera uma série de consequências geopolíticas na questão”, afirmou. Lopes citou outro exemplo.

“E temos o exemplo da Armênia, que é outro país que tem a sua matriz elétrica muito voltada à questão nuclear. Mas se tirar essa produção de energia eles não têm outras fontes e aí entra a questão ética. Como que a gente vai conciliar a questão ambiental com a questão social?”, questionou Lopes. 

Sustentabilidade e política

Sustentabilidade
Sustentabilidade (Foto: Fundación del Centro Histórico de la Ciudad de México)

O caso da Armênia se reflete em outras nações pelo mundo. O professor Otacílio Lopes argumentou que não podemos ter uma sociedade que privilegia apenas um lado ou outro da discussão, pois, no conceito dele, “a sustentabilidade é uma coisa mais geral”.

“Sustentabilidade no meu entendimento é  voltada para a sustentabilidade ambiental, mas também econômica e social. Então quando a gente fala de energia elétrica, a gente também está falando sobre um assunto muito ético que  tem muita questão que a gente precisa discutir”, destacou.

Muitos países apresentam dificuldades de cumprir os acordos internacionais ambientais  por causa das desigualdades sociais e tecnológicas entre eles e por causas naturais de não possuírem os recursos renováveis em abundância. Para o professor, essas questões sociais também precisam ser levadas em conta na questão global.

Um caso atual interessante, de acordo com Otacílio Lopes, é o da Alemanha. O país europeu já dependeu muito de suas matrizes não renováveis, mas é uma das nações que está liderando a transição energética, não pela causa ambiental, mas por questões geopolíticas.

“É mais por uma questão geopolítica porque a Alemanha dependia muito dos recursos naturais que vinham da Rússia, que usava muito isso como moeda de barganha. Então, essa transição energética está sendo liderada pelos países da Europa muito mais para se livrar dessa dependência. É uma questão voltada para os acordos, claro, para tentar cumpri-los, mas também para se livrar da dependência. Então uma coisa está contribuindo com a outra”, analisou Lopes.    

Corrida verde

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Foto: Nossos Biomas/TV Brasil

Diante dos acordos assinados nos últimos anos e das questões geopolíticas que os países enfrentam atualmente, o professor Otacílio Lopes destacou algumas iniciativas de transição de matrizes energéticas pelo mundo. Segundo ele, há projetos “interessantes” nos Estados Unidos e em alguns países do Leste Asiático para aproveitar a energia maremotriz, que usa o movimento das ondas.

“Observamos também algumas questões muito interessantes em países escandinavos para gerar a energia geotérmica, essa que vem do interior da terra. Então existem possibilidades ao longo do mundo”, pontuou.

Nesta corrida verde o Brasil tem potencial para ser protagonista. Pois, além da forte matriz hidrelétrica, já exploramos as matrizes solar, eólica, biomassa e maremotriz. Em seu artigo, o professor Otacílio Lopes destacou que o contexto ambiental favorece a escolha da matriz elétrica e que, assim, o Brasil é um exemplo de produção de energia limpa no mundo.

No entanto, o geógrafo afirmou que são importantes estudos aprimorando outras fontes de energia renováveis, não só no Brasil, mas no mundo.

“Um leque maior de possibilidades de fontes renováveis de energia é essencial para democratizar a transição energética para todos os países, algo essencial para que o objetivo dos acordos climáticos seja atingido”, disse.

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