Norberto Salomão
Norberto Salomão
Norberto Salomão é Advogado, Historiador, Professor de História, Analista de Geopolítica e Política Internacional, Mestre em Ciências da Religião e Especialista em Mídia e Educação.

Como os judeus iniciaram a ocupação da Palestina

A partir do projeto do Movimento Sionista grupos de judeus começaram a se instalar na região da Palestina, desde o início do século XX, constituindo pequenas comunidades israelitas ou judaicas, convivendo com um contingente populacional de maioria árabe. Com o passar dos anos, mais judeus foram retornando para a região o que levou ao aumento do número de assentamentos. Grande parte desses assentamentos foram constituídos em terras compradas dos árabes a preços baixíssimos.

De certa maneira houve um projeto de compra de terras para abrigar os milhares de judeus, que movidos por um sentimento nacionalista e religioso, retornavam àquela que consideram como sua “terra prometida”.

Nesse sentido, convém destacar a atuação do Fundo Nacional Judaico, uma entidade sionista fundada em 1901 no Quinto Congresso Sionista na Basileia-Suíça, com o objetivo de reunir recursos para comprar terras na Palestina e desenvolver as condições básicas para acolher as levas de judeus imigrantes.

Quem chefiou o Fundo Nacional Judaico em seus momentos iniciais foi um rico judeu, originário de Odessa, na Ucrânia, mas radicado em Viena na Áustria, chamado Johann Kremenezky. Sob sua liderança foram criadas as caixas de recolha da Fundação, também denominadas caixas azuis, pela qual se buscavam doações dos milhares de judeus espalhados pelo mundo, para viabilizar recursos para a aquisição de terras e a colonização de territórios na Palestina. Estima-se que pelo menos um milhão dessas caixas de arrecadação de donativos foram distribuídas. Além disso, o Fundo realizava eventos e vendia uma espécie de selo colaborativo, para ampliar a arrecadação.

Em meados da década de 1930, a extensão de terras adquiridas pela fundação já era de 362 km², nas quais estavam instaladas 108 comunidades judaicas. Estima-se que atualmente o Fundo detenha 13% das terras em Israel.

Assim, comprando terras e tendo o apoio e o compromisso do Reino Unido para a grande imigração, os judeus foram ocupando, realizando o florestamento e aplicando técnicas modernas de agricultura, em áreas antes desérticas ou impróprias para o cultivo, e, dessa forma, viabilizou a constituição de um número cada vez maior de assentamentos. Entre 1919 e 1939, 400.000 imigrantes judeus instalaram-se na Palestina.

Essa modificação no perfil demográfico da região da Palestina, no período entreguerras, agravou as contradições internas, não só entre judeus e árabes, mas também destes com as autoridades britânicas, que tinham autoridade internacional sobre a região. Dessa maneira, os britânicos não conseguiam concretizar a promessa de estabelecimento de um Estado judaico e também não cumpriram a promessa de que as nações árabes ficariam livres após o desmembramento do Império Turco Otomano. Assim, as décadas de 1920 e 1930 foram marcadas por constantes conflitos e revoltas na região. Os britânicos combateram com dureza e crueldade esses levantes estimulando o ódio de judeus e árabes contra o poder inglês.

Em um contexto de profunda insegurança e tendo em vista as ações do Irgun, grupo paramilitar israelense, houve um grande deslocamento de árabes para fora da Palestina. Internamente os árabes-palestinos passaram a se concentrar nas regiões da Cisjordânia e Faixa de Gaza. É certo que esses forçosos deslocamentos populacionais de palestinos também é outro fator que  favoreceu a ocupação pelos judeus.

O holocausto e os primeiros anos após a 2ªGuerra Mundial

Enquanto na região da Palestina os conflitos se agravavam cada vez mais, na Europa a situação também passou a ser de tensão. A partir de 1933 houve a ascensão do nazismo ao poder na Alemanha. Um dos pilares do nazismo era o ideal de superioridade da raça ariana. Assim, as pessoas consideradas “racialmente inferiores”, como os judeus e os ciganos, seriam alvo de perseguição, trabalhos forçados e extermínio.

A base do holocausto foi o antissemitismo (discriminação e ódio aos judeus). Os nazistas imputavam aos judeus as causas dos problemas sociais e econômicos. Afirmavam também que eles desvirtuavam a verdadeira cultura e as artes. Além disso, consideravam que o apoio de judeus sionistas aos britânicos, na 1ª Guerra Mundial, foi uma traição à Alemanha.

A Alemanha nazista e seus aliados implementaram, entre 1933 e 1945, uma série de cruéis medidas antissemitas, que levou milhões de judeus a serem perseguidos e mortos. De tudo isso, o mais grave foi a chamada “Solução Final” (Endlösung der Judenfrage), um sistemático processo de extermínio do povo judeu.

https://www.bbc.com/portuguese/internacional-60407090

A derrota da Alemanha nazista e de seus aliados, em 1945, permitiu revelar ao mundo as atrocidades do holocausto. A comoção mundial em relação aos descendentes do povo da Bíblia, os hebreus, fortaleceu o ideal sionista de consolidar um Estado judaico independente na Palestina.

Após a Segunda Guerra Mundial milhares de judeus que sobreviveram à fúria do holocausto não tinham para onde ir. Assim, ainda permaneciam em campos para deslocados de guerra estabelecidos na Alemanha, na Áustria e na Itália. Muitos desses judeus temiam retornar a seus antigos lares temendo que ainda pudessem sofrer as consequências do antissemitismo.

Diante desse quadro, muitos judeus vislumbravam, como opção mais viável, a imigração para a Palestina, ainda sob Mandato Britânico. Estima-se em 250 mil o número de judeus deslocados pela guerra, nos territórios da Alemanha, Áustria e Itália.

Porém, esse deslocamento tinha que enfrentar uma série de dificuldades. A Inglaterra, por exemplo, não queria o aumento de judeus na Palestina, temendo o aumento da violência na região. Em 1947 chegou a obrigar o retorno, para a Alemanha, de um navio com 4.500 sobreviventes do Holocausto. A Inglaterra também passou a utilizar a prática de deter os refugiados judeus, que não tinham autorização para entrar na Palestina, e enviá-los para campos de detenção localizados na ilha de Chipre.

A proposta da ONU não resolveu a questão da Palestina

A crise dos refugiados ou deslocados de guerra judeus gerava uma comoção internacional cada vez maior para a efetivação e reconhecimento de um Estado judaico.

Esgotados com os gastos na 2ª Guerra Mundial, o Reino Unido transferiu a questão territorial da Palestina para a ONU. Esta propôs, em 1947, a criação de dois Estados na região, um Estado árabe e um Estado judeu. A proposta era que esses Estados fossem reconhecidos levando-se em conta a ocupação territorial naquele momento. Assim, não se considerou a ocupação histórica dos palestinos, que estavam na região havia 1.300 anos, desde o século VII. Tendo em vista essa proposta da ONU, na possível partilha da Palestina em dois Estados, os judeus ficariam com 53% do território e os árabes com 47%.

https://brasilescola.uol.com.br/geografia/questao-palestina.htm

Os judeus aceitaram a proposta da ONU e, efetivaram o seu Estado, em 1948, sob a liderança de David Ben-Gurion.  Já os árabes não aceitaram a proposta, por alguns motivos: não reconheciam a legitimidade da ocupação judaica na região; consideram-se os legítimos herdeiros de Abraão e, portanto, com direitos à terra prometida; a cultura em organização tribal e as disputas internas entre esses grupos não viabilizou o desejo pela formação de um Estado unificado; o pretenso Estado palestino seria estruturado em um território descontínuo, sendo a parte norte na Cisjordânia e a parte sul na Faixa de Gaza, separados pelo território do Estado de Israel.

Os países árabes vizinhos (Síria, Líbano, Jordânia, Iraque e Egito) sentiram-se ameaçados e acreditavam que a ONU e o mundo ocidental poderiam validar possíveis expansões de Israel sobre os seus respectivos territórios.

O resultado de todos esses ressentimentos e temores foi que poucas horas depois do anúncio da independência de Israel, os países da Liga Árabe declararam guerra a Israel. Com o apoio das potências ocidentais Israel venceu. Os palestinos levaram a pior, pois além de perderem parte dos territórios que ocupavam, houve um saldo de 700 mil refugiados palestinos.  Nakba (catástrofe) é o termo que os árabes utilizam para definir esse êxodo.

https://brasilescola.uol.com.br/geografia/questao-palestina.htm

Outro conflito marcante ocorreu em 1967, a chamada Guerra dos Seis Dias. Mais uma vez Israel enfrentaria as forças de Egito, Jordânia e Síria. Nessa guerra Israel não só venceu mais uma vez os árabes, como realizou a maior expansão do seu território, passando a controlar militarmente a Cisjordânia, Jerusalém Oriental, a Faixa de Gaza e as Colinas do Golã. Israel passou a implantar assentamentos judaicos em várias dessas regiões.

https://www.maxieduca.com.br/blog/historia-2/guerra-seis-dias/

Posteriormente outros conflitos, acordos e tentativas de acordos têm ocorrido. Contudo, até nossos dias não foi possível uma solução definitiva para a causa palestina. Desde então uma exigência dos árabes, sempre estão em uma mesa de negociação sobre o tema, é que as fronteiras de Israel voltem ao que eram antes da Guerra dos Seis Dias.

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