Nesta semana foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara o Projeto Lei 490/2007 que prevê alteração na demarcação de terras indígenas. Dessa forma, a PL determina que são terras indígenas aquelas ocupadas pelos povos originários a partir do dia 5 de outubro de 1988. Com isso, seria necessário a comprovação da posse dessas terras a partir desse dia. A decisão gerou revolta e protestos dos indígenas em Brasília. Agora o texto vai para o Plenário da Câmara e posteriormente ao Senado para aprovação ou não.

Previsto para começar no Supremo Tribunal Federal (STF) no último dia 30, o julgamento mais importante para os povos indígenas no Brasil em três décadas foi adiado para 25 de agosto. Os ministros não conseguiram concluir a análise dos itens anteriores da pauta.

Para conversar sobre esse assunto, o Debate Super Sábado recebeu nesta edição (3), a Juliana Batista, advogada do Instituto Socioambiental e Alexandre Herbetta, doutor em Antropologia atuante no Núcleo Takinahakỹ de Formação Superior Indígena. Participaram ainda o jurista indígena Leomar Wahinê e Mirna Anaquiri, pesquisadora associada do Centro Latino-Americano de Estudos em Cultural.

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Alteração da demarcação das terras indígenas

“A PL 490 é uma ameaça aos povos indígenas, é violência contra esses povos indígenas. A tese do Marco Temporal, que foi adiado o julgamento. Nós estávamos presente em Brasília no dia do julgamento, mas em cima da hora o Supremo Tribunal Federal adiou, tirou da pauta a tese do Marco Temporal. Estamos muito preocupados porque é um momento difícil que nós estamos vivendo. O Marco Temporal é inconstitucional, e nos indígenas estamos na luta para que nossos direitos sejam respeitados”, comentou Leomar Wahinê.

O jurista também afirmou que apesar da PL ter sido aprovada no CCJ, há a esperança que não ocorra aprovação no Senado. Ele disse que as manifestações deverão continuar e que o movimento não aceitará que direitos sejam desrespeitados. Leomar também comentou sobre o projeto do Marco Temporal, e afirmou que não é de interesse dos indígenas.

“É um projeto que não é de interesse do país, mas sim do ruralistas, do governo. Então, é muito triste essa situação que estamos vivendo porque querem que os direitos originários dos povos indígenas sejam reconhecidos a partir de 1988. A nossa história não começa em 1988, começa muito antes da Constituição”.

Já para Mirna Anaquiri, um fator preocupante da PL 490 é que ela coloca em risco a vida de todas as pessoas, não apenas dos povos originários. “A gente está falando de demarcação de terra e de pessoas pertencentes aos povos indígenas, mas essa lei prejudica todas as pessoas, porque quem cuida da terra, da água, do ar, as terras que são preservadas no Brasil, é a população indígena. Então é importante destacar que a PL 490 é uma ameaça de vida para todas as pessoas”, ressaltou.

Comprovação de posse

Caso seja aprovada em definitivo, será necessário que os povos indígenas mostrem alguma comprovação da posse das terras desde 5 de outubro de 1988. A advogada do Instituto Socioambiental, Juliana Batista explicou que é muito difícil que uma população consiga apresentar tal documento: “Eu desafio qualquer pessoa a apresentar uma prova de onde estava no dia 5 de outubro de 1988. O grande problema é você exigir a prova 32 anos depois. Se nesse dia os povos indígenas soubessem que 32 anos depois eles teriam que fazer essa prova, muitos poderiam ter guardado”.

Segundo Juliana, há também um segundo problema: alguns povos realmente não estavam nas terras. “Eu trabalho em uma comunidade que na década de 70, a Força Aérea Brasileira saltou no território, abriu uma pista de pouso, tiraram a comunidade com armas na cabeça. Colocaram todo mundo dentro do avião e transferiram, removeram a força para uma outra terra”.

Para Alexandre Herbetta, a PL visa transformar o território indígena em espaço para exploração sem o consentimento da populações originárias, o que significaria um retrocesso. “Quando você pega a PL 490 e busca os grupos anti-indígenas, como por exemplo a bancada ruralista que busca tirar os direitos ao território, transformar o território em espaço de exploração econômica […] você está trazendo um outro projeto de sociedade para o Brasil, está retrocedendo”.

Mariana Tolentino é estagiária do Sistema Sagres de Comunicação, em parceria com o Iphac e a Unialfa sob a supervisão do jornalista Johann Germano