Na última semana, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) anunciou o veto à distribuição gratuita de absorventes para alunas de escolas públicas e mulheres em situação de vulnerabilidade. Segundo Bolsonaro, ele foi obrigado a negar a iniciativa porque não há detalhes sobre a origem do dinheiro que realizam a distribuição. A notícia causou descontentamento e muitas críticas dos defensores da medida, que visa combater a pobreza menstrual.

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Para discutir as consequências do veto, o Debate Super Sábado #266 recebeu cinco especialistas: a secretária Municipal de Direitos Humanos e Políticas Afirmativas (SMDHPA), Dra. Cristina Lopes, a vereadora Aava Santiago (PSDB) e também a ginecologista e diretora da Sociedade Goiana de Ginecologia e Obstetrícia Joice Lima, a coordenadora do Núcleo Especializado de Defesa e Promoção dos Direitos da Mulher (Nudem) da Defensoria Pública de Goiás (DPE-GO) Gabriela Hamdan, e a coordenadora da Central Única das Favelas (Cufa) de Aparecida de Goiânia, Ana Carla Alves.

“Muitas mulheres me mandam mensagem falando que não vão receber uma cesta porque está menstruada, que não sai de casa porque está menstruada com medo de sujar a roupa porque não tem absorventes; porque usa um papel higiênico ou usa um pano que fica lavando e pode ocasionar diversas doenças”, relata a presidente da Cufa Aparecida sobre a situação de pobreza menstrual de mulheres em situação de vulnerabilidade social. Assista ao Debate Super Sábado #266 a partir de 01:06:00

De acordo com as especialistas, não ter um absorvente interfere na integridade da mulher, principalmente meninas jovens que chegam a faltar as aulas por não terem esse material essencial todo mês. A coordenadora do Nudem Gabriela Hamdan ressalta que esse direito está inserido no Artigo 1 da Constituição Federal descrito como Dignidade da Pessoa Humana. Segunda ela, com dados do Unicef, cerca de 4 milhões de estudantes brasileiras não têm acesso a itens básicos menstruais.

“Uma a cada quatro brasileiras faltam aula quando estão menstruadas. Então quando falamos de distribuição de absorventes, estamos falando da saúde das mulheres”. afirma. “Essas falas e situações refletem, infelizmente, o pensamento do presidente da República quando ele vetou esses itens tão importantes”, complementa.

A ginecologista Joice Lima destaca as consequências do uso de materiais inadequados no período da menstruação, que pode acarretar em várias doenças e prejuízos, inclusive emocionais, para as mulheres.

“Imaginem vocês uma mulher colocar miolo de pão dentro da vagina. O pão é alimento, ele vai ser um meio de cultura para bactérias, essa mulher vai evoluir a corrimentos que podem ser graves e ficarem restritos não só à vagina, mas podem atingir o útero e ovário. Pode interferir no futuro reprodutivo dessa mulher”, alerta.

No início da semana, a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos Damares Alves anunciou um programa para de distribuição de absorventes, mas que a população teria de escolher entre a medida para conter a pobreza menstrual e a vacina para a Covid-19. Questionada sobre o papel das mulheres no governo brasileiro, Cristina Lopes afirmou que a reação causada pela suspensão foi inesperada por aqueles que desenham as políticas públicas no atual governo.

“Esse projeto que foi aprovado e foi vetado está em discussão no Congresso Nacional desde 2013. E depois do veto, o governo vem a público mostrando total inabilidade e desconhecimento. Quando um presidente da República chama de ‘auxílio modess’, ele está fazendo apologia a uma marca de absorvente porque ele ignora o que é esse mundo, ignora o que é essa realidade”.

Para justificar o veto, Bolsonaro disse que o projeto não detalha de onde virão os recursos para a compra de absorventes. A vereadora Aava Santiago rebate esse argumento do presidente.

“Quando um parlamentar elabora um projeto que tem a ver com aquisição de qualquer coisa com aumento de despesa, se não tiver muito explicadinho, o veto é o caminho natural. […] Mas o projeto está especificando que o recurso vem do Sistema Único de Saúde (SUS), o recurso vem de destinação para a saúde e também vem de destinação para a educação. Não é só um drama individual das mulheres e dos corpos das mulheres. É um problema coletivo e de acesso a educação, ao mercado de trabalho. Mulheres são privadas de direitos constitucionais”.

Mariana Tolentino é estagiária do Sistema Sagres de Comunicação, em parceria com o Iphac e Unialfa sob a supervisão do jornalista Johann Germano