Uma investigação conduzida pelo Greenpeace Brasil revelou que bancos públicos e privados, tanto nacionais quanto internacionais, destinaram mais de R$ 43 milhões em crédito rural, entre 2018 e 2023, para 12 propriedades rurais envolvidas em diversas irregularidades socioambientais na Amazônia. Esses achados são detalhados no relatório intitulado “Bancando a Extinção: Bancos e Investidores como Cúmplices no Desmatamento”.

Entre os casos identificados está o de uma fazenda em Rio Branco (AC), que ocupava parcialmente uma área de Floresta Pública Não Destinada de domínio estadual e registrou um desmatamento de 420 hectares entre 2016 e 2022. Mesmo assim, o proprietário obteve crédito rural de dois bancos públicos brasileiros.

O relatório destaca a ausência de impedimento para a concessão dos 10 contratos à fazenda, uma vez que o local não estava sujeito a embargo pelo Ibama. Isso evidencia como brechas nas regras atuais da política de crédito rural facilitam o financiamento a desmatadores e grileiros.

Apesar do Manual do Crédito Rural prever restrições para a concessão de financiamento a propriedades com áreas embargadas, o estudo identificou 798 imóveis com embargo do Ibama associados a desmatamento que receberam crédito rural. Um exemplo é uma fazenda em Novo Repartimento (PA), multada e embargada pelo Ibama por desmatamento ilegal em 2016, mas que ainda assim obteve dois contratos de financiamento.

Crédito rural

O crédito rural, uma modalidade de crédito destinada a produtores rurais no Brasil, é operado por bancos públicos e privados, nacionais e internacionais, sob autorização do Banco Central do Brasil. Parte dos recursos desse crédito recebe subsídios do governo para oferecer juros mais baixos e prazos mais longos aos beneficiários.

Embora o crédito rural seja um importante instrumento da política agrícola brasileira, deveria estimular práticas agrícolas sustentáveis para reduzir o impacto ambiental. No entanto, conforme aponta o relatório do Greenpeace Brasil, devido a lacunas nas regras e à falta de monitoramento dos créditos concedidos, os bancos não conseguem distinguir entre agricultores legítimos e criminosos ambientais, permitindo que o financiamento também alcance aqueles que destroem a Amazônia, suas florestas, seus povos e sua biodiversidade.

“O financiamento a crimes que derrubam a floresta e expandem a produção agropecuária na Amazônia não se limita a recursos de origens clandestinas. Parte é oferecida por grandes bancos públicos e privados que, sem controle adequado, direcionam recursos para atividades envolvidas com irregularidades”, explica Cristiane Mazzetti, porta-voz do Greenpeace Brasil.

O estudo também revelou que, entre 2018 e 2022, considerando o Bioma Amazônia, um grande número de propriedades recebeu crédito rural, apesar de sobreposições com unidades de conservação, terras indígenas e florestas públicas não destinadas, além de registros de desmatamento.

Medidas rigorosas

Diante desses fatos alarmantes, é urgente que as instituições financeiras e reguladoras do sistema financeiro adotem medidas rigorosas para evitar que recursos sejam direcionados a atividades que resultem na destruição ambiental e na violação de direitos humanos. Tanto os reguladores quanto as instituições financeiras precisam aumentar o rigor das regras para a concessão de crédito para atividades agropecuárias, revisar as operações vigentes e cancelar ou suspender aquelas identificadas com irregularidades socioambientais.

“O estudo evidencia a necessidade de maior rigor no cumprimento das normas vigentes e uma série de melhorias nos critérios socioambientais para a concessão de crédito rural, a fim de cobrir as lacunas na regulação do crédito rural”, adverte Mazzetti. “É preciso colocar em prática, por exemplo, a exigência de monitoramento contínuo das propriedades financiadas e a verificação da legalidade do desmatamento se este for identificado no imóvel rural, vide que apenas uma pequena porcentagem do desmatamento ilegal é embargada”, completa.

Em um contexto global, é fundamental que o sistema financeiro passe por uma reforma imediata e drástica para se alinhar à meta de limitar o aquecimento do planeta em 1,5 ºC, conforme estabelecido no Acordo de Paris, e atender ao Marco Global de Biodiversidade, que inclui o sistema financeiro como parte de suas metas para frear a perda de biodiversidade.

“As nações precisam tomar medidas eficazes para garantir o alinhamento de todos os fluxos financeiros aos compromissos estabelecidos no Acordo de Paris e no Marco Global da Biodiversidade. Não temos mais tempo a perder, o dinheiro precisa parar de fluir para fazendas e empresas que destroem o meio ambiente e fomentam as múltiplas crises que vivemos”, diz Mazzetti.

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 13 – Ação Global Contra a Mudança Climática

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