Um estudo recente conduzido pelo Todos Pela Educação revela que o número de professores concursados nas redes estaduais de ensino atingiu o seu ponto mais baixo em uma década. Enquanto isso, o contingente de professores temporários cresceu de forma significativa entre 2013 e 2023, conforme indicam as análises.

Os dados apontam uma inversão notável desde 2022, onde o número de docentes contratados superou aqueles admitidos por concurso, mantendo-se essa tendência no ano subsequente. Em 2023, as redes estaduais abrigavam 356 mil professores temporários, registrando um aumento de 55% ao longo de dez anos. Em contrapartida, o contingente de professores efetivos diminuiu em 36% no mesmo período, totalizando 321 mil.

Quantidade de docentes da rede estadual no Brasil, por tipo de contratação (em milhares) – 2013 a 2023

O gráfico mostra duas linhas que representam diferentes tipos de dados ao longo dos anos, de 2013 a 2023. A linha azul representa "Efetivos", e a laranja representa "Temporários". Os valores iniciais em 2013 para "Efetivos" são de 505 (marcado com 68,4% em uma bolha azul escura), e para "Temporários" são de 230 (marcado com 31,1% em uma bolha laranja). No decorrer dos anos, a linha azul mostra uma tendência de queda gradual, chegando a 356 em 2023. Inversamente, a linha laranja apresenta um aumento gradual, alcançando 321 em 2023.  As porcentagens mudaram significativamente em 2023, onde os "Efetivos" compõem agora 51,6% do total (mostrado em uma bolha azul claro), enquanto os "Temporários" compõem 46,5% (em uma bolha laranja mais clara). Esta mudança sugere que a proporção de "Temporários" em relação aos "Efetivos" aumentou ao longo do período de 10 anos. O gráfico pode estar ilustrando uma tendência de emprego em uma empresa ou indústria, indicando um aumento relativo na contratação de trabalhadores temporários em comparação com trabalhadores efetivos (permanentes)
Fonte: MEC/Inep – Sinopse Estatística da Educação Básica. Elaboração: Todos Pela Educação

Expansão

Uma das razões apontadas para esse aumento expressivo nas contratações temporárias é a expansão geral do corpo docente das redes estaduais nos últimos anos. Entre 2020 e 2023, por exemplo, houve um acréscimo de quase 30 mil profissionais, embora ao longo da década tenha havido uma redução geral de 57 mil docentes, algo alinhado à diminuição das matrículas na Educação Básica.

“A contratação de professores temporários é um elemento importante para garantir que as redes de ensino consigam compor o seu quadro completo de docentes, assegurando que os estudantes tenham aulas de todas as disciplinas. No entanto, esse tipo de contratação deveria ser uma exceção, a ser utilizada em casos específicos previstos na legislação, mas o que vemos é que ela tem se tornado a regra nas redes estaduais de ensino”, avalia Ivan Gontijo, gerente de Políticas Educacionais do Todos Pela Educação.

“Isso está relacionado com a  baixa frequência de realização de concursos públicos para docentes, motivada por diversas questões, como a proibição de novos concursos em decorrência da pandemia, desafios fiscais nos estados e a própria preferência de alguns gestores pelo modelo de contratação mais flexível. Isso pode trazer impactos negativos para a Educação, em especial quando se observa que em muitas redes é baixa a qualidade das políticas de seleção, alocação, remuneração e formação para esses profissionais”, completa.

Variação

O estudo também destaca que a proporção de docentes temporários e efetivos varia consideravelmente entre as Unidades Federativas do país. Em 2023, 15 unidades federativas apresentaram um contingente maior de professores temporários em comparação aos efetivos, e ao longo da década, 16 UFs testemunharam um aumento no número de professores temporários e uma redução nos concursados.

Analisando o perfil dos professores temporários nas redes estaduais com base em dados do Censo Escolar (2020) e do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) (2021), observa-se que, em média, esses profissionais têm 40 anos de idade, em contraste com os 46 anos dos docentes efetivos.

Além disso, cerca de 43,6% dos professores temporários estão atuando há pelo menos 11 anos, sugerindo que essas contratações não servem apenas para atender demandas pontuais, mas também para compor o quadro docente permanente em algumas redes de ensino.

Impactos

Por fim, o estudo levanta preocupações sobre os possíveis impactos dos contratos temporários na qualidade da educação brasileira. Uma análise dos dados do Saeb revelou uma correlação entre a contratação temporária e um desempenho acadêmico inferior dos alunos, tanto em Língua Portuguesa quanto em Matemática, mesmo após considerar fatores socioeconômicos.

“Esse cenário não deve fazer com que as redes de ensino se mobilizem para fazer grandes concursos de forma apressada para reduzir drástica e rapidamente o número de professores temporários com pouco planejamento. É preciso aprofundar os diagnósticos sobre as razões desse fenômeno em cada localidade e avaliar de forma ampla os seus impactos”, conclui Gontijo.

“Nesse sentido, é essencial avançar a discussão em duas frentes: aumentar a frequência de realização de concursos e, sobretudo, a qualidade deles, com a melhoria dos instrumentos de seleção e a inclusão de provas práticas; e o investimento em políticas de valorização e profissionalização dos docentes temporários. Tanto as redes municipais e estaduais, como também o Ministério da Educação precisam olhar com mais atenção para essa temática”, finaliza.

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 04 – Educação de Qualidade

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