Foto: Ricardo Stuckert

 

Termina o grito dos que só viam o fim da corrupção com Lula preso. Começa o grito dos que cobram o fim da corrupção, já que Lula está preso e a corrupção, não.

Termina o calvário dos que eram cobrados porque entendiam que Lula solto não estancava a sangria. Começa a luta dos que sabem que, com Lula preso, a sangria segue, mais impune do que nunca, porque segue a sensação de dever cumprido na punição devida, vendida em cadeia nacional como a expiação necessária de todos os pecados do País.

Termina a angústia dos que viam corrupção muito além de Lula, porque a angústia agora é outra. Mas a angústia de carregar uma sentença de má intenção, e não a outra, de ver o medo personificado no ódio, e vice-versa – medo sentido, medo imposto. Começa a percepção dos que não viam, dos que só sentiam medo

Termina o debate insólito dos moralistas religiosos que, em causa santa, pediam a crucificação em praça pública de um único homem, representando toda a nação, santa nação. Começa o sacrifício dos hipócritas de plantão?

Termina a fúria dos apedrejadores em nome do bem? E quando começa o Brasil onde ninguém está acima da lei?

Os que saíram pelas ruas, praças, vestiram bandeira e levantaram a cívica voz contra o mal que assola as famílias com seus direitos sociais, humanos e constitucionais que não cabem na compreensão do respeito ao próximo, porque contrariam uma interpretação bíblica da vontade dos pastores ou padres ou bispos que comungam convicções e irradiam contradições, todos estes vão manter-se firmes no caminho da luz, ou se dão por satisfeitos, para continuarem sonegando seus impostos, recebendo seus auxílios moradias e de livros e tais, contratando consultorias para subtrair-se da mira do imposto de renda e, claro, se safando da multa do trânsito e vendendo seu voto?

Termina a exposição do combate entre a esquerda e a direita, como se todos soubessem ser uma coisa ou outra, como se isso fosse fundamental quando o fundamental para quem passa fome é matar a fome e sobreviver na vida, digo, vencer na sobrevivência, digo, viver, de alguma forma, sendo que de toda forma é viver ou morrer. Começa?

A prisão de um único culpado por todos os nossos males não dá liberdade nem a uma única virtude nossa. Essa pedra não leva mensagem. Essa pedra é a mensagem de pedra da pedra.

Quando deixamos a realidade para viver das ficções alheias, e não percebemos como deixamos de pensar porque o pensamento que vem pronto tem audiência máxima assegurada pela opinião pública instigada pela mensagem compactada, significa que deixamos de viver, na realidade, para viver a realidade alheia, a realidade dos interesses de quem vende uma ilusão que nem é nossa, para assegurar a realidade deles.

Para viver outra realidade, precisamos estar fora. Aí começa.

Termina a expectativa de que, com a sua prisão, começaria algo. Talvez comece. Talvez termine. Nada impede que todos que acreditam em renovação a partir do preso, na verdade de renovem libertando-se da prisão. Que a salvação não esteja lá, mas cá de onde parte toda a inspiração.

Nada segura a conspiração dos homens contra os homens. Nem Lula. Nem os de boa vontade.

De hoje em diante, o Brasil não é mais o mesmo. Falemos mais sobre os brasileiros.

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