No Brasil, a concessão para explorar petróleo na Foz do Rio Amazonas foi recusada pelo IBAMA. Apesar disso, essa possibilidade não está definitivamente excluída, pois a solicitação da Petrobrás para reconsiderar a licença ambiental ainda aguarda avaliação. Enquanto isso, nações vizinhas como Colômbia e Equador estão tomando a liderança ao rejeitar a exploração de petróleo na região amazônica. Isso demonstra que eles já estão encaminhados para uma transição energética necessária e para a preservação do ecossistema.

Na segunda-feira (21), foi anunciado o desfecho da consulta popular promovida pelo Equador sobre esse tema. Com mais de 90% dos votos contabilizados, cerca de seis em cada dez equatorianos manifestaram oposição à extração de petróleo no Parque Nacional Yasuni, uma das áreas mais ricas em biodiversidade em todo o mundo.

“Os equatorianos decidiram revogar a licença social do petróleo. Isso significa que querem a transição energética na Amazônia agora, e não em 2030 ou 2050. Essa decisão não está condicionada a compensações financeiras por parte da comunidade internacional, e os equatorianos mostram, assim, sua determinação em buscar um desenvolvimento livre de emissões, dando um exemplo contundente aos demais países da região”, diz a presidente do Instituto Talanoa e membro do Painel de Acreditação do Green Climate Fun, Natalie Unterstell.

(Blocos de exploração na bacia sedimentar da Foz do Amazonas | Foto: Ibama)

O coletivo ambiental Yasunidos liderou uma iniciativa de alcance nacional para convocar a consulta sobre o Bloco 43-ITT. Após um esforço que resultou na coleta de 757 mil assinaturas, eles perseveraram em uma batalha jurídica que se estendeu por uma década junto aos órgãos eleitorais do Equador. O veredicto da votação determinou que a empresa estatal de petróleo, Petroecuador, tem a responsabilidade de encerrar suas operações na região dentro de um período de um ano. O prazo oficial começará a ser contado a partir de 4 de outubro de 2023.

“A consulta popular sobre Yasuní é importante para o Equador, mas também para o mundo inteiro. Diante da inação dos diferentes governos do mundo, os equatorianos estão decidindo tomar medidas reais contra a mudança climática”, afirma Antonella Calle Avislés, da ONG Yasunidos, promotora do plebiscito de Yasuní.

“É também uma mensagem para todos os países amazônicos, pois vemos que os governos não estão fazendo sua parte. Se não exigirmos uma ação concreta, essa crise não terá volta”, complementa.

Reserva mundial

Em 1989, a Unesco designou o Yasuní como uma reserva mundial da biosfera. Com mais de 1 milhão de hectares, essa região é renomada por sua megadiversidade e é lar dos povos Tagaeri e Taromenane, que vivem em isolamento. O Bloco 43-ITT ocupa uma porção do Yasuní, uma área natural protegida que abrange um milhão de hectares, abrigando uma riqueza de biodiversidade, incluindo mais de 2.000 espécies de árvores e arbustos, 204 mamíferos, 610 aves, 121 répteis, 150 anfíbios e mais de 250 peixes.

O Bloco 43-ITT é responsável por uma produção diária de 55.000 barris de petróleo bruto, representando cerca de 11% da produção nacional de petróleo do Equador, que totaliza quase 480.000 barris por dia. Essa exploração petrolífera tem gerado, de acordo com o governo, lucros no valor de US$ 1,2 bilhão. No entanto, ambientalistas acreditam que os ganhos reais possam ser substancialmente menores e defendem a implementação de um imposto sobre a riqueza como forma de compensação.

Essa situação representa um revés para o presidente do Equador, Guillermo Lasso, que advogou pela exploração de petróleo como um pilar fundamental da economia do país. O referendo ocorreu simultaneamente à eleição presidencial, na qual a candidata de esquerda, Luisa González, e o candidato de direita, Daniel Noboa, irão para um segundo turno para determinar o vencedor. O país está vivenciando turbulência política devido ao assassinato de um dos candidatos, Fernando Villavicencio, em 9 de agosto.

Alternativa

“Temos de comemorar o resultado da consulta pública no Equador. Os conflitos sobre a continuidade ou não da exploração de petróleo no Parque Yasuní são muito parecidos com os que ocorrem hoje no Brasil na Foz do Amazonas e em outras bacias sedimentares da Margem Equatorial. Em um mundo atingido pela crise climática e por eventos extremos sucessivos, tenta-se impor uma ideia equivocada e anacrônica de que a produção de petróleo resolve problemas sociais. Não resolve”, argumenta a especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima, Suely Araújo.

A região da foz do Rio Amazonas é amplamente reconhecida como uma área de extrema sensibilidade socioambiental devido à presença de elementos valiosos em termos de conservação. Esta região abriga diversas Unidades de Conservação (UCs) e Terras Indígenas (TIs), bem como importantes ecossistemas como mangues e formações biogênicas de organismos como corais e esponjas. Além disso, a diversidade marinha nesta área é notável, incluindo espécies ameaçadas de extinção, tais como o boto-cinza, o boto-vermelho, o cachalote, a baleia-fin, o peixe-boi-marinho, o peixe-boi-amazônico e o tracajá.

“A torcida é para que o Brasil siga o caminho escolhido pelos equatorianos, que votaram na consulta popular, com o olhar para as futuras gerações e para o destino do planeta”, afirma Suely.

“Desde 2013, povos indígenas, jovens e mulheres estão na vanguarda desse apelo para proteger a enorme biodiversidade e os povos indígenas que vivem em harmonia com a natureza. Neste mundo “em ebulição”, o Equador se torna um exemplo de defesa da vida, a partir do qual se pode pensar e projetar os horizontes de uma transição pós-extrativista de que tanto precisamos”, destacou Maristella Svampa, do Pacto Ecossocial e Intercultural do Sul.

O diretor do WWF-Equador, Tarsicio Granizo, expressou grande entusiasmo diante da resolução tomada pelo povo equatoriano. Ele enfatizou a significativa relevância ecológica da área que será preservada da atividade extrativa prejudicial ao meio ambiente.

“Os dados fornecidos pela ciência esclarecem a necessidade de conservar e proteger essa área de alta diversidade biológica e cultural e, assim, evitar o chamado “ponto de não retorno” na Amazônia. É por isso que o WWF acredita que é essencial avançar em direção a uma mudança de modelo de desenvolvimento baseado na justiça social e ambiental, bem como em uma transição energética”, finalizou.

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 13 – Ação Global Contra a Mudança Climática

Leia mais: