A Campanha Nacional em Defesa do Cerrado e a Comissão Pastoral da Terra (CPT), em colaboração com a Fiocruz, revelaram em pesquisa que o uso indiscriminado de agrotóxicos, especialmente nas regiões de intensificação do agronegócio, atua como uma arma química, prejudicando a produção e reprodução da vida.

“Então o uso indiscriminado de agrotóxicos no Maranhão precisa urgentemente de junções acadêmicas com as comunidades, somando aos movimentos sociais, para que sejam identificados os compostos utilizados, sendo que alguns podem nem ser mais regulamentados dentro do Brasil ou internacionalmente e procurar políticas públicas que possam impedir ou melhorar o uso”, explica a pesquisadora do Instituto Federal do Maranhão (IFMA), Georgiana Marques.

Os dados das consequências desse problema foram publicados no estudo “Vivendo em Territórios Contaminados: Um Dossiê sobre Agrotóxicos nas Águas do Cerrado”. O Cerrado, berço de importantes rios brasileiros, enfrenta uma crise ambiental sem precedentes.

“Isso causa o quê nas famílias das comunidades? Preferencialmente, processos alérgicos, processos intestinais, e muitos desses agrotóxicos, como os glifosatos, já classificamos como carcinogênicos e podem levar até à morte. Nós temos casos de crianças com feridas expostas, coceiras… e nos traz uma preocupação, além da questão do meio ambiente, porque eles não podem usar essa água para consumo próprio”, complementa Georgiana.

Além de sofrer com o desmatamento acelerado, a pesquisa apontou que a região é envenenada com mais de 600 milhões de litros de agrotóxicos despejados anualmente. Este número representa mais de 70% do consumo total de agrotóxicos no Brasil em 2018, de acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

Quilombo Cocalinho

O Maranhão, parte da fronteira agrícola do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), é um exemplo preocupante. No Quilombo Cocalinho, em Parnarama, foram detectados nove tipos de agrotóxicos em uma única amostra de água. Essa mistura é ainda mais perigosa do que um produto isolado. Embora o território quilombola tenha sido reconhecido pela Fundação Cultural Palmares desde 2014, a falta de titularização agrava a insegurança e os conflitos na comunidade.

“A pesquisa mostra que as pessoas estão tomando aguas contaminadas, literalmente estão tomando veneno todos os dias. Isso é causado pelo agronegócio, pelas plantações de soja e eucalipto que se espalham por todo o Maranhão, assim como em outras regiões do Cerrado, em especial no corredor MATOPIBA”, denuncia Ariana Gomes, da Rede Maranhense de Agroecologia (RAMA).

“A gente não sabe mais por onde correr, qual a solução buscar para esse problema, porque a gente vê a nível nacional, a nível estadual, a ganância desses plantadores de milho, de soja (…) essa pulverização que eles fazem aérea contaminam nossa plantação e nossas águas, nos lençóis freáticos como nas caixas d’água, nas cisternas, isso tudo contamina”, explica Raimunda Nonata, liderança quilombola de Cocalinho.

Impacto na saúde e no meio ambiente

Nonata, uma quebradeira de coco babaçu, alerta que a água contaminada adoece o meio ambiente, afetando também as roças, os animais e as pessoas. “As águas dos açudes, dos poços cacimbões, dos poços artesianos, todas essas águas estão contaminadas com esses agrotóxicos, e a gente não tem outra alterativa a não ser consumir essa água, com esses agrotóxicos. Está difícil a nossa sobrevivência dentro do território”.

Este cenário de envenenamento é comum em diversos territórios de expansão do agronegócio, levando a debates sobre a criação de um marco regulatório internacional contra o uso indiscriminado de agrotóxicos na Organização das Nações Unidas. No entanto, este processo pode levar anos e depende do engajamento das lideranças mundiais e do enfrentamento ao poder econômico das grandes indústrias.

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 11 – Cidades e Comunidades Sustentáveis; ODS 12 – Consumo e Produção Responsáveis

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