(Foto: Arquivo Pessoal)

Moscou, 13 de junho de de 2018

O último dia da história do planeta sem a Copa do Mundo de 2018 começou cedo, em um carro alugado pelos amigos da Agência EFE, rumo a Bronitzki, cidade a 60km de Moscou, para o treino da seleção da Argentina.

Ao contrário do que costuma acontecer, os 15 últimos minutos da atividade (e não os 15 primeiros) eram abertos para a imprensa, o que muda um pouco a ordem as coisas: em vez de assistir ao aquecimento e à roda de bobinho, os jornalistas veem uma espécie de fim de feira do treino de finalizações.

Depois, entrevista coletiva, a primeira de jogadores argentinos desde a convocação, e os escolhidos foram…Dois goleiros, Caballero e Guzman .Nada de Messi, Agüero, Dybala ou Di María. Cinquenta minutos, algumas risadas, clima descontraído, e perguntas apenas de jornalistas argentinos de meios de comunicação argentinos. “Cosas que pasan en un Mundial”, diria um amigo.

Fim do trabalho por lá, duas horas de carro para voltar a Moscou e mais 50 minutos para entrar andar 3km até o hotel da Fifa, onde tinha marcado de encontrar Luiz Felipe Scolari – conheci o treinador da seleção do penta em Bilbao, há dois meses, e queria bater um papo com ele sobre a Copa.

O saguão do hotel oficial da Fifa é um dos lugares mais interessantes para se estar durante uma cobertura. Companheiros jornalistas especializados em bastidores dividem o espaço com dirigentes, funcionários, alguns VIPs desconhecidos que nunca chutaram uma bola e personalidades como Pierluigi Colina, Fabio Capello, Enzo Francescoli, Marcel Desailly, Samuel Eto’o, Carles Puyol, Farid Mondragón…

E Scolari. O técnico do último Brasil campeão do mundo (e, claro, também do fatídico 7 a 1 no Mineirão, há 4 anos) está em Moscou apenas para o jogo de abertura. Veio com a esposa, dona Olga, que pela primeira vez assistirá a um jogo de Copa no estádio. “Ela nunca foi, nunca gostou, nao sabe nem quem são os times”, brincou.

Entre tantas celebridades no lobby do hotel, Felipão é uma figura reconhecida e admirada. Fabio Capello, amigo dos tempos em que ambos treinaram na China, deu um longo e caloroso abraço no gaúcho; e o que se seguiu foi um diálogo em um idioma próprio, que misturava italiano, espanhol e português. Dois dos grandes técnicos dos anos 90 e início deste século, transbordando admiração mútua e divertindo-se a um dia do início de uma Copa em que estarão apenas como convidados, sem a pressão do banco de reservas. Um desses momentos que fazem uma cobertura valer a pena.

Era difícil pensar que meu terceiro dia em Moscou – e o último antes de começar a viajar pela Rússia e só voltar para a final – poderia reservar outro desses momentos. Mas aconteceu.

Quando entrei no táxi para voltar ao hotel, vi que havia algo diferente: fato raro e até então inédito na Rússia, o taxista queria conversa. Na Rússia, os taxistas nunca querem conversa. Mas Umiad (traduzi o nome dos caracteres cirílicos, espero estar certo), tentava puxar papo. Pediu meu celular, escreveu algo no Google Tradutor, respondi, e conversa engrenou. Escreveu (enquanto dirigia, coisas da Rússia) que pensou que eu era dos Estados Unidos, que gosta de futebol, que queria que o Brasil conquistasse o hexa.

No intenso trânsito de Moscou, também me contou, agora com gestos, que não conseguia falar. Nem inglês, nem russo, nem qualquer outro idioma. Sim, o primeiro taxista que quis conversa na Rússia, meu primeiro amigo neste país ainda desconhecido era mudo. No fim da curta viagem, de uns 15 minutos,  pediu para que tirássemos uma foto. Só coloquei uma condição: que eu também fizesse a foto com meu telefone.

Queria guardar a lembrança de meu primeiro amigo por essas bandas. Do dia em que nada pôde impedir que duas pessoas pudessem se comunicar usando o idioma universal do futebol.