Segundo um recente relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), cerca de 300 milhões de pessoas fizeram uso de algum tipo de droga no ano de 2022. Entre os diferentes motivos para o dado apresentado, está o aumento da produção de drogas sintéticas — como LSD, ecstasy, K2, anfetaminas, poppers, efedrinas, entre outras.
Um dos maiores problemas associados ao aumento da fabricação e da utilização de drogas no mundo são os desafios sociais e econômicos impostos por esse mercado, principalmente para as populações mais vulneráveis, além de parte dos transtornos desenvolvidos após o uso dessas substâncias.
Prevenção
Marcelo da Silveira Campos, doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP) e professor adjunto do Instituto de Ciências Humanas da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), explica que a busca por soluções para a questão deve ser iniciada a partir da prevenção ao uso de drogas — por meio do uso da política de saúde de redução de danos.
A ideia de “combate”, que atravessou os anos 70, 80 e 90 e é muito associada ao período ditatorial da política nacional — momento em que é lançada a antiga Lei de Drogas no País, portanto, tornou-se ultrapassada. O professor analisa, contudo, que essas duas frentes estão presentes na atual Lei de Drogas, sancionada em 2006. “Como a gente sabe, de forma geral, a ideia de guerra às drogas tem o aumento das prisões. Ela se revela, no Brasil, com 30% dos homens e 55% de todas as mulheres presas por drogas”, comenta.
Dessa forma, o especialista afirma que a ideia de combate não funciona na busca por uma solução para a problemática, sendo necessário que a administração pública amplie seu olhar para a questão. O atual Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad) começa a pensar sob uma nova ótica apesar de, segundo Marcelo, não contemplar a ideia de prevenção inteiramente. “Ela não incorporou a ideia de prevenção e menos ainda ela aplica. É só a gente ver o número de pessoas presas e a quantidade de pessoas que são assistidas na Rede de Assistência Psicossocial e na Rede de Assistência Social”, analisa.
O professor questiona também a quem a lei é aplicada no País. “A gente sabe que as classes alta e média usam e abusam do uso de drogas. Elas também comercializam essas drogas, mas elas nunca vão presas por isso.” Assim, nota-se que a política de combate às drogas prende e mata dentro das favelas e periferias brasileiras, enquanto se distancia dos bairros nobres e privilegiados — ou seja, na teoria, a lei é aplicada a todos, mas não funciona dessa forma na prática.
Desafios
Outro aspecto importante que pode ser analisado sobre a questão são os diferentes problemas associados ao Sistema de Justiça nacional. Marcelo explica que os problemas começam quando pensamos que a atual lei de drogas não apresenta nenhuma quantidade de porte de drogas para diferenciar usuário de traficante. “Ela instituiu que a diferenciação entre usuário e comércio de drogas deveria ser feita pelas circunstâncias sociais e pessoais do agente”, relata.
Assim, é possível notar que a lei não apresenta nenhum critério objetivo, universal ou de ampliação de direitos, mas apresenta justamente um método distintivo e hierarquizado. Por esse motivo, a ideia de incorporação da prevenção à saúde lateral não é aplicada dentro do próprio sistema.
Hoje, o melhor caminho para a situação, segundo Marcelo, poderia ser tomado por meio do Recurso Extraordinário 635.659, que descriminaliza e torna inconstitucional a criminalização das drogas. Assim, o uso de drogas começaria a ser tratado como uma questão de saúde pública e não como uma questão criminal, o que significa que, na prática, seria necessário iniciar um trabalho de distinção do usuário e do traficante. Além disso, seria também importante o início de um trabalho de mudança de mentalidade dentro do sistema de justiça criminal.
Saúde pública
Para além de uma questão social, a problemática demonstra-se também como uma questão de saúde pública. João Paulo Lotufo, coordenador do projeto antitabágico do Hospital Universitário da USP, explica que as drogas sintéticas podem produzir alucinações por estimular ou deprimir o sistema nervoso central. A anfetamina, o LSC e o ecstasy são alguns exemplos dessas substâncias.
“O grande problema é que quando se consome uma droga vendida por aí, não se pode ter certeza de que você está comprando exatamente o que dizem estar vendendo”, alerta o especialista. É possível notar também que as drogas sintéticas podem afetar o cérebro de diferentes maneiras — variando de acordo com a substância utilizada.
O número de jovens que consomem tais drogas apresentou um aumento nos últimos anos; para Lotufo, o maior problema dessa questão é o fato do cérebro desses indivíduos ainda estar em desenvolvimento fazendo com que a dependência se instale mais rápido. “A falta de informações sobre os riscos das drogas é real”, finaliza.
Com informações do Jornal da USP*
Este conteúdo está alinhado ao Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU) ODS 03 – Saúde e Bem – Estar.
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