A Universidade Federal de Goiás (UFG) sediou, na quinta-feira, 1º, um evento com o propósito de tomar uma posição no combate ao abuso e exploração sexual de crianças. De acordo com dado divulgado pela instituição, a cada 15 segundos uma criança sofre esse tipo de crime no Brasil.

O encontro “Estudo de Caso, Manejo Clínico, Aspectos Jurídicos e Midiáticos nas Situações de Violências contra Crianças e Adolescentes” encerrou uma série de atividades durante o Maio Laranja. Sendo assim, nesse mês ocorreu eventos em todo o país com o objetivo de combater essa inaceitável realidade.

Durante as discussões do encontro, os convidados mostraram que esse problema não possui uma solução simples e exige ações tanto individuais quanto públicas. Nesse sentido, o objetivo foi ressaltar a importância de intensificar as denúncias, fornecer atendimento multidisciplinar às vítimas e promover a conscientização da sociedade civil organizada.

O objetivo é gerar uma consciência coletiva sobre a necessidade de denunciar os criminosos e proteger as crianças e adolescentes contra todos os tipos de abuso. Além disso, é fundamental lembrar que o Disque 100 é o canal para denúncias de casos de violência sexual contra crianças e adolescentes.

“Conscientizar é proteger”

Durante a abertura do evento, os conselheiros tutelares de Goiânia realizaram uma performance com o tema “conscientizar é proteger”. Na apresentação, eles ressaltaram que a omissão também constitui uma forma de abuso. A ideia foi destacar a importância de cada indivíduo estar atento e não se calar diante dos casos, que frequentemente ocorrem dentro do ambiente familiar das crianças.

Iniciando os discursos da manhã, a psicóloga Railda Martins, da Rede de Atenção à Criança e ao Adolescente, enfatizou que é essencial capacitar os profissionais. Eles precisam acolher e humanizar o atendimento às crianças que chegam em busca de cuidado após terem sofrido abusos. Ela ressaltou que as rotinas diárias podem consumir a humanidade das pessoas, mas é crucial que os profissionais estejam preparados para proporcionar um cuidado sensível e empático às vítimas.

“O Brasil tem 523 anos de abusos. E diante disso nós não vamos nos calar. Que ganhemos forças para seguir lembrando e lutando até o próximo 18 de maio”, comentou Joseleno Vieira. Ele é coordenador do Fórum Goiano para o enfrentamento da violência contra a criança.

Campanha

A vereadora Kátia Maria convocou todos a se unirem em prol da campanha “Faça Bonito” e destacou a importância de fazer uma diferença real na vida de cada indivíduo. Ela anunciou que pretende propor um Projeto de Lei (PL) para instituir a realização de ações de discussão e capacitação dos profissionais de educação e saúde da capital, referentes a esse tema, em todos os dias 18.

A proposta visa promover um ambiente propício para a conscientização e o aprimoramento dos profissionais responsáveis pela educação e saúde das crianças e adolescentes. Nesse sentido, com um suporte efetivo no combate ao abuso e exploração sexual. Através dessa iniciativa, busca-se reforçar a importância desse tema e criar oportunidades regulares para discuti-lo e capacitar os profissionais envolvidos.

“Nunca é demais lembrar que quase a totalidade de casos ocorre dentro dos lares. Por isso a necessidade urgente das discussões também fortalecidas nas escolas como um espaço de acolhimento e proteção”, ressaltou.

Políticas

De acordo com Maria Luiza Moura, diretora da Proteção da Criança e do Adolescente do Ministério dos Direitos Humanos, é responsabilidade do Estado zelar pelos direitos desses jovens cidadãos. “A criança é um sujeito de direito e do presente”, defendeu.

Ela também destacou que este ano ocorrerão eleições para preencher as mais de 35 mil vagas de conselheiros tutelares em todo o Brasil. “Todos devem se responsabilizar por eleger essas pessoas que atuam diretamente atendendo e prevenindo situações de violência com nossos jovens”, concluiu.

Além disso, a reitora da UFG, Angelita Pereira de Lima, marcou presença na cerimônia de abertura. Sendo assim, ela ressaltou que quase todos os membros da mesa diretiva e dos organizadores do evento possuem vínculos atuais ou passados com a Universidade.

“Nós que estamos à frente de instituições tão potentes devemos atuar para nos colocar à serviço da sociedade de maneira ampliada e em várias frentes, para realmente fazer a diferença na vida das pessoas. Vamos fortalecer essa ideia. Porque nossa atuação não é só nessa data ou na área da saúde especificamente, o problema é complexo é deve ser discutido e abordado nas mais variadas políticas públicas”, pontuou.

Saúde pública

Após a cerimônia de abertura, os palestrantes iniciaram suas apresentações. De acordo com a médica sanitarista do HC-UFG/Ebserh, Marta Maria Alves da Silva, é fundamental que toda a sociedade esteja consciente de que o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes constituem um problema de saúde pública, com um impacto significativo no bem-estar e que repercute ao longo de suas vidas.

“A Organização Mundial de Saúde entende que muitas vezes o estupro tem repercussões que podem ser equipadas com indivíduos vítimas de guerras”, exemplificou.

Em seguida, a professora Fátima Marinho, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), deu início à sua apresentação. Ela abordou a perspectiva histórica da legislação penal no Brasil. Nesse sentido, ressaltou que aqueles expostos a essa violência enfrentam uma cicatriz psíquica de difícil reparação.

“A grande maioria são meninas as principais vítimas e geralmente a violência é cometida por conhecidos ou parentes. Nesse ponto podemos afirmar que a educação domiciliar é sim um risco adicional”, ressaltou.

Importância da denúncia

Marta Silva destacou que as unidades de saúde também são uma das portas de entrada para crianças e adolescentes vítimas de abuso. “Recebemos no mês passado um pedido para a realização de uma laqueadura em uma adolescente de 14 anos que está na segunda gestação. Como é possível nenhum profissional de saúde envolvido mencionar ou denunciar a situação para que se entenda as condições nas quais essa menina está exposta?”, questionou.

Em seguida, duas meninas, com 11 e 12 anos, da cidade de Goiânia, relataram seus casos. Ela não apenas foram vítimas de violência sexual, mas também tiveram que levar adiante suas gestações. Isso contraria o direito constitucional de interrupção da gravidez em casos de estupro. A médica destacou que esses casos que chegam ao conhecimento da mídia representam apenas uma minoria, e muitas vezes são rapidamente esquecidos. “Nós profissionais de saúde não podemos ficar omissos frente a isso”, criticou.

Olimpo Barbosa de Moraes Filho, professor da Universidade Federal de Pernambuco, realizou uma análise dos casos. De acordo com ele, é importante o atendimento por uma equipe multiprofissional para apoiar crianças e adolescentes vítimas de abuso. Além disso, ressaltou que essa abordagem abrange desde a prevenção da gravidez até as questões legais envolvidas. O professor também destacou que o risco de complicações ginecológicas graves, como a eclâmpsia, é cinco vezes maior para essas meninas durante a gravidez.

“Temos o dado alarmante de que 14 mil meninas abaixo de 14 anos foram mães no Brasil em 2021. Quantas delas foram vítimas de estupro? Quando uma paciente diz que está com cefaleia ninguém questiona, por que se duvida quando ela diz que foi estuprada?”, finalizou.

*Esse conteúdo está de acordo com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU 03 e 16 – Saúde e Bem Estar e Paz e Justiça

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