No mês de maio, o Ministério da Educação (MEC) promoveu o lançamento oficial do Programa Escola em Tempo Integral, baseado no objetivo de ampliação em 1 milhão de matrículas na modalidade. Para isso, o Governo Federal deve investir cerca de 4 bilhões de reais, segundo informações do próprio ministério.

De acordo com dados divulgados pelo Censo Escolar em 2022, cerca de 20,4% dos estudantes da rede pública estavam em escolas de tempo integral até o ano passado. Nesse sentido, o Ministério reforça a existência de um longo caminho à diante, visto que o Plano Nacional de Educação (PNE) prevê que até 2024, a oferta de tempo integral deveria envolver no mínimo 50% das escolas públicas.

“O aspecto principal para uma política nacional como essa dar certo é a articulação com estados e municípios. Ouvir as necessidades de cada um deles e as percepções de como a política poderia ser melhor implantada”, é o que explica o gestor e especialista em educação, Helber Vieira.

Execução

Em entrevista para o Sagres Online, a comunicação oficial do Ministério da Educação (MEC) informou que o ministério irá pactuar com estados e municípios, mais o Distrito Federal. Nesse contexto, a articulação envolve as metas para as matrículas cujas as jornadas correspondam a pelo menos 7 horas diárias ou 35 semanais.

“As parcelas serão transferidas levando em conta as matrículas pactuadas, o valor do fomento e os critérios de equidade. Nas etapas seguintes, o Programa irá implementar estratégias de assistência técnica junto às redes de ensino para a adoção do tempo integral, com o olhar para a redução das desigualdades”, afirma.

Além disso, em entrevista, o MEC ressalta que entre as ações planejadas, é possível citar investimentos em infraestrutura, bem como a “criação de indicadores de avaliação e sistema de avaliação continuada”.

O Programa Escola em Tempo Integral não é a primeira iniciativa divulgada pelo Ministério da Educação nos últimos anos. A pauta já vem aparecendo em meio aos discursos oficiais e em propostas de especialistas e pesquisadores em educação.

Histórico

Nos últimos anos, é possível citar os seguintes documentos que se articulam com a proposta de ampliação de matrículas em tempo integral:

  • Portaria MEC Nº145 (2016): Institui o Programa de Fomento à Implementação de Escolas em Tempo Integral
  • Resolução Nº7 (2016): Estabelece os procedimentos para a transferência de recursos de fomento à implantação de escolas de ensino médio em tempo integral
  • Portaria Nº727 (2017): Estabelece novas diretrizes, novos parâmetros e critérios para o Programa de Fomento às Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral, de acordo com a Lei 13.415 que estabeleceu novo modelo para o Ensino Médio.

Monitoramento

“Estabelecer e monitorar metas deve ser uma preocupação genuína de todo gestor educacional. O Brasil não tem uma situação de abundância de recursos para investimento na Educação. O que faz com que seja necessário o estabelecimento e o monitoramento dessas metas”, explica Helber Vieira, que já atuou como secretário adjunto de Educação Básica do MEC.

Segundo ele, após a instituição de uma política pública, sobretudo de abrangência e impacto nacionais, é preciso que haja espaço para a sociedade acompanhá-la. Além disso, se preciso, cobrar os gestores educacionais para o alcance das metas estabelecidas.

Na página de apresentação do Programa, o MEC apresenta exemplos de resultados esperados para a política. Entre eles, a melhora de indicadores de aprendizagem, avanço na qualidade social da Educação Básica e inclusão social para estudantes mais vulnerabilizados.

Educação Integral

O conceito de educação integral ultrapassa a noção de aumento da carga horária, ou seja, não se limita apenas pela noção de mais horas na sala de aula. É o que explica a mestre em educação pela Universidade de Brasília (UNB) e doutoranda em Direitos Humanos e Cidadania, Simone Conceição.

“Envolve valores, princípios, crenças, ideais, culturas, etimologias geoeconômicas, geográficas, ou seja, engloba saberes inerentes aos papeis dos sujeitos históricos transmitidos de geração em geração. É uma ação democrática para os grupos socialmente vulneráveis na sociedade”, complementa a pesquisadora.

Nesse mesmo sentido, o especialista Helber Vieira explica que a Educação Integral, quando executada de maneira efetiva, é uma importante aliada no combate às desigualdades.

“Não é apenas ampliar o tempo da jornada para matérias de instrução formal e tradicional como estamos acostumados a ver na escola. Uma escola com perspectiva de Educação Integral irá trazer benefícios especialmente se tiver uma visão que implemente estratégias de estímulos como esporte, música, atividades culturais e de lazer”, explica Vieira.

Entraves

“É importante salientar que uma educação integral não se pauta apenas na carga horária. É preciso que haja a formação de professores e um educar que viabilize uma educação crítica e autônoma dos estudantes”, explica a pesquisadora Simone Conceição.

Nesse viés, ela destaca a necessidade de que políticas de ampliação de escolas de tempo integral enxerguem o caráter emancipatório desse tipo de educação e ressalta que condições estruturais ainda comprometem o potencial do modelo, ainda que seja possível verificar certo grau de evolução nas discussões mais recentes.

“A falta de investimento de certa forma, exclui um modelo de educação integral que vem sendo construído. Essa realidade leva ao assistencialismo da educação integral”, afirma. Sobre o conceito de “assistencialismo”, a pesquisadora explica que se trata do cenário em que instituições importantes como a família não se engajam na formação dos estudantes.

“O assistencialismo da educação integral é uma reclamação de muitos profissionais da educação. Pais colocam o filho na escola e deixam à cargo da instituição”, complementa.

Educação como direito

Para defensores do modelo de tempo integral, a modalidade entrega melhores condições de aprendizagem para estudantes de escolas públicas. Além disso, maior competitividade nas etapas para ingresso na Educação Superior.

Segundo Vieira, o Brasil não é o pioneiro quando se trata de apostar em políticas públicas para a educação em tempo integral.

“Os países desenvolvidos fazem isso amplamente há muitos anos. O Brasil não pode ficar para trás. Dada a escassez de recursos que o país tem, deve começar a beneficiar em especial as áreas mais vulneráveis do país. Mas no fundo, deve ser compreendido pela sociedade como um direito de qualquer criança brasileira”, afirma.

Encaminhamentos

De acordo com o Ministério da Educação (MEC), ainda não há uma expectativa de quantas redes estaduais estão interessadas em aderir ao Programa Escola em Tempo Integral. A aderência não é obrigatória e, segundo a pasta, a pactuação não será feita de modo individualizado, mas com estados, municípios e o Distrito Federal.

“A perspectiva é positiva, levando-se em conta o diálogo estabelecido com os entes federados”, afirmam. Em comunicado oficial, o MEC afirma que até o final de 2026, o objetivo é alcançar cerca de 3,2 milhões de matrículas em tempo integral.

Ainda de acordo com o ministério, a adesão ao programa é de responsabilidade do governo municipal, estadual ou do DF. Além disso, o processo é feito por meio de cadastro no Sistema Integrado de Monitoramento Execução e Controle (SIMEC).

“Caberá ao MEC a operacionalização do programa, por meio da Coordenação-Geral de Educação Integral e Tempo Integral (COGEITI), da Diretoria de Políticas e Diretrizes da Educação Básica Integral (DPDI) da Secretaria de Educação Básica (SEB)”, explicam.

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