O ano era 2009. Aos 34 anos, Eliane Gonçalves Malaquias, mãe de seis filhos e com uma autoestima sempre nas alturas, recebeu a notícia de que estava com câncer. Preocupada com o corpo, ela própria havia desconfiado de um pequeno caroço no seio direito que descobriu fazendo o autoexame durante o banho. 

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“Como amamentei muito, meus peitos empedraram muito. Então eu tinha o hábito de toda vez que tomava banho fazer o autoexame. Mas nunca imaginei. Então apareceu um carocinho. Cheguei no serviço e comentei com uma amiga minha”, conta.

Foto: Arquivo Pessoal

Ela então fez uma mamografia que apontou nove nódulos em um dos seios. Era o câncer. O médico analisou o exame e disse para Eliane ficar calma, procurar uma oncologista e que sairia sorrindo da consulta. “Se eu estou condenada à morte, como que vou sair de um consultório sorrindo?”, questionou Eliane, que só pensava nos filhos. 

No papel

Após receber a notícia do câncer na mama, contudo, Eliane foi para casa. Preocupada com o futuro dos filhos, tratou de fazer um testamento registrando o que deixaria para cada um dos herdeiros. 

“Passei a noite e a madrugada de quinta para sexta-feira chorando para meus filhos. Mas eu também já tinha decidido a vida deles. O que eu daria para cada um deixei em papel passado. Eu iria morrer mas meus filhos ficariam todos amparados. Fui para a próxima consulta [no dia seguinte] de óculos escuros que minha amiga me deu, de tanto chorar”, relata.

Ao chegar ao consultório, porém, Eliane recebeu da oncologista uma folha de papel e uma caneta. Nele, ela deveria escrever quais dúvidas tinha em relação ao diagnóstico e ao tratamento contra o câncer. 

Eliane em evento no TST em Brasília em 2023 (Foto: Arquivo Pessoal)

“Escrevi: ‘Meu cabelo vai cair? Eu vou morrer?’ Aí a médica disse que meu cabelo iria cair mas depois iria nascer. Ela disse que na segunda quimioterapia meu cabelo iria começar a nascer. E se você fizer tudo que eu te falar, de câncer você não vai morrer”, conta. 

Como em todos os momentos da vida da estudante de Direito, Eliane realmente saiu da consulta sorridente e cheia de esperança. O câncer havia sido descoberto no início, o que, portanto, aumentou a chance de cura com o tratamento. 

Queda de cabelo

Com a quimioterapia, começaram a cair os primeiros fios. Eliane precisou raspar a cabeça. O que ela não contava, porém, era que precisaria consolar a cabeleireira, que caiu em prantos ao ver a situação que a cliente estava passando. “Saí de casa e fui para o salão consolar ela. Falei ‘não, isso aqui é cabelo, vai nascer’. Consolei ela e voltei para casa, carecona”, conta Eliane. 

Com bom humor, vencendo cada uma das etapas e com a saúde emocional em dia, Eliane realmente encarou o câncer. Além disso, recusou as perucas e aderiu ao novo visual. “‘Você vai usar peruca? Não vai, não’, diziam meus amigos. Aí eu comecei a botar brincão e só careca. Para onde eu ia eu me achava a top do momento”, relata. 

“Eu tinha seis vidas que dependiam de mim. Era só eu e minhas vidinhas. Eles foram tudo para mim. Primeiro foi Deus e depois eles. Batia aquela angústia de vez em quando, mas era só eu, eu tinha que mostrar para os filhos que eu estava bem e para os amigos. Eu fui trabalhando isso [na minha cabeça], de que iria passar e era só uma fase. Fiquei com as unhas pretas, com olheira”, complementa. 

Covid-19

A luta contra o câncer estava oficialmente encerrada. Além disso, os filhos estavam bem encaminhados. No entanto, Eliane enfrentaria ainda outro problema. No ano passado, com o curso de Direito em andamento, ela acabou testando positivo para Covid-19. “Fiquei sete dias na UTI e mais quatro na enfermaria. Foi aquela história ‘entuba’ ou ‘não entuba’. Estive muito perto de perder a vida”, conta. 

A Covid-19, entretanto, acabou deixando sequelas no seio, só que dessa vez o esquerdo. Foi necessária uma nova cirurgia para remoção e reposicionamento das próteses. Com a mesma alegria e bom humor, Eliane encarou o problema. As lições do enfrentamento ao câncer, anos atrás, deram mais forças para superar mais esse momento difícil. 

Eliane venceu também a Covid-19 em 2022 (Foto: Arquivo Pessoal)

“Você tem que aceitar o que está vindo para você e não focar em ninguém. O cabelo vai cair, [mas] vai voltar. Você careca é linda, com cabelo é linda. Isso é momento, é fase. E outra coisa: não aceitar ninguém ter pena de você, quem tem pena é galinha. Quero que as pessoas possam acrescentar para mim, não para me diminuir. Pena, não”, reforça. 

Prestes a concluir o curso de Direito, Eliane deixa uma mensagem a todas as mulheres vítimas de câncer ou que possuem algum caso na família. “Tenham fé em Deus. Não é fácil. Até porque quando eu descobri eu tirei uma noite e um dia para chorar. Quando der vontade de chorar, chore, não guarde, exploda, mas confie em Deus. É fase. Cada um recebe de um jeito, mas a vitória é sua. Tudo nessa vida serve de lição. É uma doença? É, mas você vai vencer. Deus está no comando de tudo e sabe de todas as coisas”, conclui.

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