O futebol vai muito além de um esporte, e semanalmente situações acontecem para nos lembrar disso. Os insultos racistas contra Vini Jr no domingo passado (21), o último dentre dezenas de casos que o atacante brasileiro sofreu desde que chegou na Espanha, ganhou uma proporção poucas vezes vista para expor um problema enraizado na sociedade.
O racismo no futebol europeu não é nenhuma novidade. Existem registros desde o início das transmissões internacionais, nos anos 1980, com casos tão absurdos quanto o que aconteceu com o jogador do Real Madrid e da seleção brasileira. Entretanto, a repercussão dessa vez envolveu líderes mundiais e forte pressão sobre as entidades espanholas.
Ademais de ser uma herança da própria formação da cultura europeia, o aumento de abusos raciais nos estádios e nas redes sociais também coincide com a onda de nacionalismo, motivada ainda pelo avanço da extrema-direita na política europeia. A intolerância se faz cada vez mais presente na sociedade mundial.
Por trás de um falso discurso de liberdade de expressão, muitos indivíduos perderam o pudor de serem ignorantes e desrespeitosos. Inclusive, também de serem criminosas. Afinal de contas, racismo é um crime de ódio previsto nas legislações de diversas nações. Mas na falta de punições, o abuso racial e xenofóbico parece longe de uma solução.
“Se uma pessoa como o Vini Jr, com a fama que tem e um ídolo no futebol, sofre isso, imagina as barbaridades que acontecem na Europa com alguém de uma condição social e de status menor”, alertou o professor de história e geopolítica Norberto Salomão, que produz o podcast Sagres Internacional.
Leia mais
- Debates Esportivos #145 | Vinícius Júnior: luta de um brasileiro contra o racismo
- E se o caso Vini Jr fosse no Brasil: quais punições a lei prevê para torcedores?
- Os insultos a Vini Jr e a cultura do racismo na Espanha
O grupo que dirigiu os últimos insultos racistas ao atacante brasileiro é comandado por uma célula neonazista. Fato que se repete para além do futebol espanhol e se vê com frequência em torcidas de outros países. No entanto, o problema do racismo vai muito além de um suposto crescimento ou domínio político da extrema-direita.
“Entendo que é um aspecto cultural da Europa mesmo, dos que se acham brancos. E não falo só de brancos, mas daqueles que se acham brancos contra negros e asiáticos”, explicou o professor Salomão. Os casos se repetem nos mais diversos contextos, e nem governos de esquerda ou direita demonstraram interesse em combater antes.
Nesta semana, o goleiro Unai Simón, do Athletic Bilbao e da seleção espanhola, deu um importante depoimento em coletiva. “É um reflexo do que acontece em todos os lados e um problema da sociedade. É algo que todos temos que erradicar o quanto antes. Não deveria ocorrer no futebol ou em nenhum outro lugar”, afirmou.
Para além das quatro linhas, o racismo é um assunto que “tem que ser discutido. Inclusive, é um assunto para ser levado à ONU”, frisou Norberto Salomão, que acrescentou que “essa questão racial tem que estar presente nessas reuniões, talvez a medida mais importante a ser tomada”.
Não bastam hashtags nas redes sociais ou cartazes nos estádios, jogos de portões ou setores fechados e detenções sem incriminações. Não basta só não ser racista, é preciso ser antirracista.