Infância, adolescência, fase adulta e velhice. Nas quatro fases da vida o ser humano carrega uma série de questões e busca por respostas quase que incessantemente. Um detalhe é que essa resposta pode ser encontrada ao seu redor, na natureza, através da observação. Com um diferencial em relação aos demais seres vivos do planeta Terra – a capacidade de manipular matéria -, o ser humano transformou grandes florestas em cidades de pedra e perdeu parte do contato com sua origem.

Na busca por respostas, a biomimética mostra como a observação da natureza não pode ser perdida e que existem inúmeros benefícios que a utilização do meio ambiente com responsabilidade pode gerar. A educação é mais uma fonte de respostas e, também, uma das maneiras de promover esse conceito, a fim de observar a natureza e encontrar soluções sustentáveis para o meio ambiente.

A professora de Biologia Thailla Franco, em entrevista com a Sagres

A professora de Biologia, Thaílla Franco, que ministra aulas para o Ensino Médio, explicou que para fazer com que os alunos se interessem pelo tema, é preciso fazê-los entender que são parte da natureza, além de compreenderem que ela faz parte da vida do estudante. “A gente precisa falar para eles: ‘Olha, tudo isso aqui, vocês fazem parte, um ser vivo depende do outro e a gente, por ser racional, por criar, precisa entender que toda criação nossa tem um bônus e um ônus'”, contou.

Para chamar atenção de estudantes que gostam de futebol, por exemplo, Thaílla citou como a chuteira da Puma, lançada em 2015 e mostrada na série da Sagres sobre Biomimética, que foi inspirada nas asas das libélulas.

Laura Landau é mestre em Biomimética

Para a mestre em biomimética, Laura Landau, a educação é como a porta de entrada para a aplicação de mais conceitos da ciência. “Uma das questões primordiais para a gente começar essa educação da biomimética é seguir os três pilares dela: Etus (ética sustentável), reconexão e emulação (uma forma de copiar com consciência essas estratégias desses organismos)”, detalhou a mestre. Dentre os três pilares, para Laura, a melhor maneira de começar é com a reconexão, pois o ser humano tem se desconectado cada vez mais da natureza.

O ser humano como parte observada na natureza

Apesar de essa facilidade de se reconectar com a natureza ser algo fora do comum atualmente, foi ao observar o próprio funcionamento do cérebro que cientistas criaram a Inteligência Artificial, por volta das décadas de 1950 e 1960.

“Alguém emulou o funcionamento de um neurônio, que a gente chama de neurônio artificial, e ele é bioinspirado. Isso foi crescendo e hoje é possível montar uma rede neural artificial que tenta simular as conexões de milhões de neurônios”, detalhou Anderson da Silva Soares, professor e coordenador do Centro de Excelência em Inteligência Artificial (Ceia) da Universidade Federal de Goiás (UFG).

professor e coordenador do Ceia, Anderson da Silva Soares

Paradoxalmente, é justamente a criação do computador que, hoje, causa um certo distanciamento entre as pessoas e a natureza. A contemplação do horizonte deu lugar ao olhar fixo em uma tela, às vezes pequena, como a de um celular.

É preciso ressaltar que há uma diferença de uma regra direta no computador, como um programa que altera a cor de uma camiseta a partir de um comando de um ser humano, para a Inteligência Artificial. Com essa IA, a tecnologia começa a identificar, por exemplo, palavras por aproximação, faz a comparação e escolhe a que julga ser similar.

“A palavra futebol tem diferentes sons e formas dependendo do sotaque de quem expressa, só que a mente humana é extremamente resiliente para entender sons próximos e parecidos para saber que é a mesma coisa. Mas para o computador isso é muito difícil, não é tão simples. Aí é que entra a IA: ‘É parecido, então eu acho que é a mesma coisa’, mesmo com pronúncias diferentes”, exemplificou o professor.

Dentre as tarefas mais complexas feitas por uma Inteligência Artificial, hoje é possível programar a criação de frases para campanhas publicitárias. Com a potência correta, o computador pode, inclusive, entregar centenas de frases em determinado espaço de tempo. “Tudo que é feito na computação busca copiar a tarefa de um ser humano, só que quando eu consigo copiar e jogar dentro de uma máquina, é extremamente escalável. A máquina não é mais inteligente, mas é muito mais rápida”, sublinhou Anderson Soares.

Ou seja, a IA é comandada por seres humanos, então basta educação para que haja a compreensão do que é realmente necessário. Assim, é possível ver a tecnologia como uma grande aliada, olhar para a tela do computador e programá-lo para trabalhar pelo horizonte.

Aplicação da Biomimética na educação

O ensino de biomimética foi considerado por Laura como algo interdisciplinar, ou seja, que pode ser aplicado em diferentes matérias e também para pessoas de qualquer idade. Porém, a mestre ressaltou que para as crianças pode ser mais fácil entender a biomimética. “Por mais que ela pareça muito técnica, a biomimética também é muito lúdica, porque fala de natureza, que é uma questão que as crianças já têm uma curiosidade natural. Quando a gente cresce, se isola aos poucos dessa natureza”, argumentou.

Uma das possibilidades, segundo Laura, é falar sobre o tema com aulas práticas para as crianças, instigando-as a realizar experimentações. “Fazer com que a criança tenha essa base desde a infância, de olhar para a natureza, ter uma curiosidade cientifica e explorar, descobrir a natureza”, projetou a mestre em biomimética.

No Ensino Médio, porém, Thaílla explicou que não é tão simples levar novos materiais para a sala de aula, diante da nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que estipula quais os conteúdos devem ser mostrados em classe. “É preciso estar dentro do padrão deles”, contou a professora.

No entanto, uma maneira eficaz, segundo a educadora, é inserir o ensino sobre biomimética em diferentes conteúdos da biologia para alunos que escolhem a eletiva. As chuteiras que foram feitas usando a dinâmica da asa das libélulas, por exemplo, poderiam ser usadas nas aulas de biologia celular e anatomia animal.

Outro caso citado pela professora é o do cupinzeiro: “Os cupins têm todo um sistema, então dá para utilizar em ecologia, com um gancho explicando essa casa, bem ventilada. A partir disso, pensar em como construir moradias mais sustentáveis para as pessoas”, declarou Thaílla.

Educando desde cedo e atingindo cada vez mais pessoas, é possível agir com a biomimética igual a um algoritmo de computador que, na verdade, foi pensado com base na observação de abelhas e formigas. Segundo o diretor do Ceia, Anderson Soares, esses insetos paralelizam as atividades e buscam várias soluções para um único problema, de maneira simultânea e independente, mas com comunicação, para que o grupo possa encontrar a maneira mais efetiva de atingir o objetivo. Esse conceito foi levado para dentro do computador, que busca milhares de soluções simultâneas para acelerar os processos.

Na prática, é como se a Thaílla, o Anderson, a Laura, a Thyélen, o Denys, a Jordanna, a Thaís, a Maria, enfim, milhares de pessoas buscassem, cada um, a melhor maneira de encontrar soluções através da biomimética e trocassem experiências para, juntos, seguirem pelo melhor caminho. Para isso, é necessário instigar a curiosidade, pois, como destacou Thaílla: “O curioso cria, cria soluções para tudo, para melhorar a própria vida e a da comunidade”, finalizou.

Na próxima semana, você verá mais detalhes de como esse assunto se conecta com o Esporte.

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