O Brasil, conhecido por sua inovação na integração de lavoura, pecuária e floresta, está agora dando passos importantes para adotar um novo modelo que combina múltiplas produções em uma única área: a geração de energia agrofotovoltaica.

Diferentemente do modelo convencional, que instala os módulos de energia solar rentes ao solo, resultando na supressão da vegetação e impossibilitando o uso agropecuário, o novo modelo a ser testado em Minas Gerais visa reunir as duas atividades no mesmo espaço. Desenvolvido na Europa por pesquisadores alemães e objeto de estudos em Pernambuco e Alagoas, essa abordagem inovadora promete benefícios significativos.

O projeto, concebido pela Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) em colaboração com a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) e o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPQD), recebe financiamento da Agência Nacional de Energia Elétrica e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig).

Módulos

O experimento será realizado em quatro módulos, cada um com uma área entre 300 e 400 metros quadrados. Sob as placas fotovoltaicas, serão cultivados melão, morango, feijão, alface e pastagem para criação de bovinos.

“Estamos ainda na fase de definição da infraestrutura das placas, altura, largura entre as fileiras para respeitar a necessidade de luz das culturas. Mas pela previsão do projeto, até maio essa estrutura provavelmente já vai estar em campo”, explica a coordenadora do projeto, coordenadora do projeto, Polyanna Mara de Oliveira.

Ainda conforme ela, o objetivo é “entregar ao produtor um modelo sustentável de produção agrofotovoltaica. Ele vai entender sobre qual altura colocar os módulos, o custo inicial, em quanto tempo vai ter o retorno do investimento, as culturas adaptadas, as mais vantajosas e os impactos ambientais, sociais e econômicos desse sistema”.

Exemplos de sucesso

Em Pernambuco, em 2019, um projeto de menor escala, mas altamente promissor, destacou-se, especialmente em regiões semiáridas. Desenvolvido em uma unidade de demonstração na Escola de Agroecologia Serta, em Ibimirim, sob a coordenação do Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA), o módulo de 24 m² apresentava 10 placas fotovoltaicas com uma potência nominal total de 3,3 kW, instaladas a cerca de dois metros do solo. Este módulo abrigava um sistema de aquaponia, onde eram cultivadas hortaliças, peixes e um galinheiro.

Ao longo de um ano, o sistema alcançou a produção de 4,8 mil KWh de energia, cerca de 130 quilos de peixes, 730 unidades de ovos, 336 quilos de hortaliças e 200 unidades de mudas de plantas nativas. O custo de implantação foi de R$ 20 mil, resultando em um retorno de R$ 10,4 mil. Além disso, a pesquisa evidenciou que o sombreamento proporcionado pelos painéis fotovoltaicos resultou em uma economia de água de 14% a 29% em comparação ao cultivo isolado de hortaliças.

Em Alagoas, desde 2022, professores do curso de Engenharia de Energia da Universidade Federal local (UFAL) estão avaliando a viabilidade do modelo agrofotovoltaico em lavouras de cana-de-açúcar. Financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas, sete estruturas com 210 painéis fotovoltaicos foram instaladas na usina Santa Clotilde, em Rio Largo, com um potencial de geração de nove megawatts-hora/mês.

Neste caso, também foi constatado um aumento na produtividade do canavial no primeiro ano em comparação ao cultivo convencional, variando de 6% a 23%, dependendo da quantidade de módulos fotovoltaicos integrados ao sistema.

Potencial de crescimento

Embora a adoção de sistemas agrofotovoltaicos seja ainda incipiente no Brasil, a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) destaca seu potencial de crescimento.

“Eu acho que é um mercado que ainda tem muito espaço para se desenvolver, está numa fase inicial no Brasil. É um modelo de aplicação que o setor solar está se familiarizando mais porque é uma tecnologia que tem saído com sucesso da pesquisa, entrado cada vez mais na aplicação e estamos nessa etapa transitória”, disse o presidente da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), Rodrigo Sauaia.

Atualmente, estima-se que existam 196 mil sistemas de geração de energia solar em áreas rurais do Brasil, representando 8,8% do total no país, com uma potência instalada de 3,6 gigawatts. “Isso significa que 14,6% de todos os investimentos em energia solar de pequeno e médio porte no Brasil estão sendo feitos por produtores rurais. Eles são o terceiro maior usuário de energia solar do país, logo depois de residenciais e pequenos negócios”, estima Sauaia.

Em Minas Gerais, os pesquisadores da Epamig têm a expectativa de que o modelo se torne referência e seja replicado em outras regiões, contribuindo para o desenvolvimento socioeconômico, especialmente nas regiões Centro-Oeste e no semiárido mineiro.

“No caso do semiárido, os resultados que encontrarmos lá terão uma importância social ainda maior porque além das limitações climáticas que temos nessa região, nós vamos também fazer coleta de água de chuva para ser reutilizada nos sistemas e avaliar a eficiência do uso da água para outras culturas”, finaliza Polyanna.

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 11 – Cidades e Comunidades Sustentáveis; ODS 12 – Consumo e Produção Responsáveis

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