O impacto das temperaturas extremas causadas pela crise climática na saúde é cada vez mais evidente. Segundo dados do observatório europeu Copernicus, junho marcou o 13º mês consecutivo de recordes nas temperaturas globais. Em 22 de julho de 2024, o mundo registrou o dia mais quente da história, com uma média de 17,16°C, superando os recordes anteriores de 17,09°C no dia anterior, 21 de julho, e de 17,08°C em 6 de julho de 2023. Esses dados são registrados desde 1940.

Análises revelam que 2023 e 2024 registraram temperaturas máximas anuais significativamente maiores do que os anos anteriores, destacando uma preocupante tendência de aquecimento global. Os dez anos mais quentes foram de 2015 a 2024.

Esse aumento nas temperaturas acende um alerta para cientistas, ambientalistas e a população em geral, que já sentem os efeitos do calor na saúde. O neurocirurgião Fabio Godinho, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, explica que o aumento do calor afeta a saúde de várias maneiras, direta e indiretamente.

“A crescente na temperatura está associada a uma série de doenças cuja frequência está aumentando, não só no Brasil, mas em outros países que também estão sofrendo mais diretamente com o calor. Dentre essas doenças, nós temos as doenças infecciosas, normalmente aquelas transmitidas por vetores como mosquitos. A malária, a dengue e a chikungunya são exemplos dessas enfermidades que estão acometendo mais pessoas. Também é observado o aumento de doenças neurológicas, como o AVC.”, explica o especialista.

Estudo

Fábio Godinho – Foto: Linkedin

Um estudo publicado no portal Scientific Reports da Nature, intitulado “Mudanças climáticas, anomalias térmicas e a recente progressão da dengue no Brasil”, revela que as ondas de calor foram responsáveis pela expansão da dengue. Se antes havia cinco dias de anomalia térmica, agora são 20 dias ou mais acima da média no verão, intensificando a transmissão do vírus.

A pesquisa analisou dados de 2000 a 2021 e concluiu que eventos climáticos extremos e degradação ambiental foram decisivos para a expansão da dengue. O calor tem implicações diretas no corpo humano.

“Temperaturas acima dos 40°C podem levar a sintomas gerais de desconforto, astenia e queda da pressão. Isso tudo acontece porque o sistema do corpo começa a precisar resfriar. Dessa forma, o sistema nervoso começa a dilatar os vasos sanguíneos periféricos, principalmente os vasos da pele, com isso você tem um aumento de fluxo sanguíneo na pele para ajudar a perder calor. Esse aumento do fluxo sanguíneo na pele gera uma queda de pressão, que é muito perigosa, principalmente em idosos. Outro sintoma é a sudorese excessiva, gerando desidratação, o que pode prejudicar o funcionamento dos órgãos. O sangue desidratado fica muito espesso e começa a ter dificuldades de fluir no corpo, diminuindo a irrigação dos órgãos, inclusive do cérebro e coração. Isso gera um risco grave em relação à possibilidade de acontecer casos como acidente vascular cerebral (AVC) ou infarto do miocárdio”, detalha.

Frequência

Além do aumento na média da temperatura, cidades brasileiras têm experimentado dias com temperaturas extremas mais frequentes. Em novembro de 2023, 43 cidades tiveram temperaturas acima de 40°C, com sensação térmica acima de 50°C, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).

“Em lugares secos o ser humano pode tolerar marcas ao redor de 50°C, isso falando em suportar tempos curtos nesses regimes de temperaturas. No entanto, para lugares mais úmidos, 40°C já é uma situação complicada, quase no limite. Isso também depende do quanto o indivíduo está aclimatado àquelas condições. Nós brasileiros somos bastante tolerantes ao calor, pois estamos habituados. Mas, ainda assim, um tempo prolongado em regimes de 40°C ou mais dificilmente pode ser suportado” alerta.

Nesse cenário, alguns grupos de pessoas necessitam de atenção especial. “Idosos e crianças certamente sentem mais com essas questões, pois são mais suscetíveis à desidratação e outras alterações fisiológicas. Em um estudo recentemente publicado pela revista Neurology, se observa que o calor tem aumentado o número de casos de doenças vasculares cerebrais, e os idosos são mais vulneráveis a isso. O índice de desenvolvimento social também é um fator importante, pois as pessoas que vivem em regiões mais pobres contam com menos estruturas para suportar o calor, tanto de isolamento térmico quanto de atendimento médico. Isso se vê nos dados. Em países mais desenvolvidos, os casos de AVC por temperaturas inadequadas se concentram em idosos, enquanto nos mais subdesenvolvidos, outras faixas etárias são atingidas. Por fim, é necessário atenção para pessoas com outras doenças associadas. Doenças crônicas como as pulmonares, cardiovasculares e renais acabam tornando a pessoa mais vulnerável também”, finaliza.

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 03 – Saúde e Bem-Estar

Leia mais: