“Quando a educação reconhece e valoriza as pautas dos povos indígenas, ela também está reconhecendo e valorizando a sua própria história.” Essa é a avaliação da professora Mirna Kambeba Omágua Yetê Anaquiri sobre a presença da literatura feita por indígenas nas escolas brasileiras. Doutora em Arte e Cultura Visual pela Universidade Federal de Goiás (UFG) e professora da rede municipal de ensino de Goiânia, Mirna aponta que o País vive uma expansão da literatura de autoria indígena, o que é fundamental para o reconhecimento e para a luta contra os estereótipos relacionados a esses povos.

A pesquisadora pondera que a literatura escrita por pessoas que não são indígenas é importante, mas ressalta o aumento das publicações de autoria indígena. “Estou falando exatamente do lugar da representatividade de pessoas que podem dizer das suas próprias narrativas, que durante muitos anos não foram vistas.” A professora, que pertence aos povos originários Kambeba Omágua, do Amazonas, também ressalta o papel das escritoras.

Entre os destaques na literatura de autoria indígena, Mirna lembra a importância das mulheres na produção literária dos povos originários. Uma das principais autoras indígenas da atualidade, Auritha Tabajara conta em sua publicação mais recente, “Coração na Aldeia, Pés no Mundo”, de 2019, as dificuldades enfrentadas durante sua formação em uma escola não indígena.  “Mulheres indígenas estão contando as suas histórias, as suas narrativas, problematizando os estereótipos”, ressalta Mirna Anaquiri. O livro Magistério ‘Indígena em Verso e Poesia”, outra obra de Auritha, foi incluído como leitura obrigatória nas escolas públicas do Ceará, estado natal da escritora.

Nome importante no enfrentamento aos estereótipos, Daniel Munduruku já publicou mais de 50 livros e é destaque internacional na literatura infantojuvenil. Suas obras são consideradas importantes instrumentos na educação de crianças e adolescentes sobre a cultura dos povos originários. Ele venceu o Prêmio Jabuti de Literatura, o mais tradicional e importante do Brasil.

“Ele é um autor que marca a nossa história da literatura indígena, porque ele já escreve há muitos anos, é um filósofo e tem muitas publicações. É um autor indígena que tem apresentado um universo infantojuvenil muito potente pra gente aprender sobre a cultura indígena”, avalia Mirna, que também é integrante da Coletiva de Mulheres Indígenas e Negras Quilombolas.

A Lei nº 11.645, de 10 março de 2008, incluiu no currículo do ensino fundamental e médio a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. No entanto, a legislação não prevê a obrigatoriedade desses estudos na formação de professores.

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Confira dicas de obras de autores indígenas contemporâneos brasileiros:

Ailton Krenak

Entre os maiores líderes e intelectuais indígenas da atualidade, Ailton Alves Lacerda Krenak é também um dos maiores personagens da história brasileira. Krenak protagonizou uma cena histórica na Assembleia Constituinte de 1987, quando denunciou a situação dos povos indígenas em um forte discurso. O autor publicou uma série de quatro livros curtos, que estão entre os mais vendidos do Brasil, em que propõe reflexões sobre a atual condição da humanidade. São eles: “Ideias para Adiar o Fim do Mundo”, “O Amanhã Não está à Venda”, “A Vida Não é Útil” e “Futuro ancestral”.

Eliane Potiguara

Conhecida como Eliane Potiguara, Eliane Lima dos Santos é uma professora, escritora, ativista e empreendedora indígena brasileira. Fundadora da Rede Grumin de Mulheres Indígenas. Foi uma das 52 brasileiras indicadas para o projeto internacional “Mil Mulheres para o Prêmio Nobel da Paz”. Em seu livro mais recente “A cura da terra”, Potiguara conta a história de Moína, uma menina de origem indígena que busca entender o sentido de sua vida, encontrando revelações sobre o sofrimento pelo qual seu povo passou e como seus ancestrais conseguiram a cura de um de seus bens mais preciosos: a terra.

Auritha Tabajara

Escritora brasileira, poeta e contadora de histórias, é conhecida por ser a primeira indígena a fazer literatura de cordel no Brasil. Além de sua obra “Magistério Indígena em Verso e Poesia” ter sido incluída como leitura obrigatória no currículo da rede de ensino estadual do Ceará. Em seu livro mais recente “Coração na aldeia, pés no mundo”,  todo em formato de cordel,  relata as dificuldades de aprendizagem de estudantes indígenas em escolas convencionais.

Daniel Munduruku

O autor venceu o Prêmio Jabuti de 2017, considerado o “oscar da literatura”, com a obra “Vozes Ancestrais”. Em 2021, Munduruku voltou a concorrer com três obras, mas não venceu. “A origem dos filhos do estrondo do trovão: uma história do povo Tariana” e “Redondeza”, concorreram na categoria Infantil. A obra  “Crônicas indígenas para rir e refletir na escola”, disputou o prêmio na categoria Infanto Juvenil.

Roni Wasiry Guará

Escritor e educador, as produções literárias de Guará se destinam predominantemente ao público infanto-juvenil. Em suas obras e atividades educacionais, o autor divulga os saberes ancestrais de seu povo, atuando como importante expoente na afirmação identitária Maraguá, povo do qual é descendente.  A obra “Olho d’água – o caminho dos sonhos” venceu o 8º Concurso Tamoios de Textos de Escritores Indígenas. 

Tiago Hakiy 

Tomar banho de rio, subir no pé de goiabeira, brincar com os animais, pescar o almoço, olhar as estrelas. “Em A pescaria do Curumim e outros poemas indígenas”, Tiago Hakiy apresenta a cultura dos índios da Amazônia às crianças sob a forma de singelos poemas. Descendente do povo sateré mawé, o autor nasceu em Barreirinha, no coração da Floresta Amazônica. O livro conta ainda com as ilustrações de Taísa Borges. Coloridos, tradicionais e de traços fortes, os desenhos contribuem para a inserção do público infantojuvenil no universo dos índios amazônicos.

Olívio Jekupé

Escritor indígena de literatura nativa, ele começou a escrever em 1984 e se formou em filosofia na Pontifícia Universidade Católica do Paraná, em 1988. Jekupé foi professor e publicou mais de 20 livros, nos quais utiliza a tradição oral, transcrevendo histórias de seu povo. Três de seus livros, “Ajuda do Saci”, “A mulher que virou Urutau” e “O presente de Jaxy Jatere” foram publicados em edições bilíngues, com texto em português e guarani. 

Graça Graúna

 Indígena descendente Potiguara, Graúna é educadora universitária e tem entre suas principais obras o emocionante conto indígena“Criaturas de Ñanderu”. O livro conta a história de uma garota com nome de pássaro que, ao tornar-se adulta, ganha asas e sai de sua tribo para conhecer a cidade grande. A autora também publicou “Canto Mestizo”, “Tessituras da Terra” e “Tear da Palavra”.

Márcia Wayna Kambeba

Da etnia Omágua/Kambeba em seu livro mais recente “Kumiça Jenó: Narrativas Poéticas dos Seres da Floresta”, os poemas de Márcia Wayna recontam a tradição oral recebida pela autora a seus ancestrais. Nesse contexto, Marcia expressa através de sua ancestralidade a relação entre a floresta, seus seres e povos, em uma poética que desperta reflexões sobre o respeito à natureza. 

Cristino Wapichana

O autor é músico, compositor, cineasta e escritor indígena premiado. Nasceu em Boa Vista, Roraima, em 1971. Seu livro “A Boca da Noite”, que transporta o leitor para uma aldeia cheia de mistérios, foi traduzido para o idioma sueco e recebeu a Estrela de Prata do Prêmio Peter Pan, do International Board on Books for Young People, da Suécia.

Luciana Vãngri Kaingáng

Ativista, educadora e líder indígena do povo Kaingáng, publicou vários livros sobre arte indígena e atualmente trabalha no Instituto Kaingáing, no Rio de Janeiro. Em seu livro ficcional, “Estrela Kaingáng: A lenda do primeiro pajé”, a autora conta a história de uma estrela que, com a ajuda da sua Mãe Lua, terá de enfrentar espíritos do mal que tentarão atacar seu filho e sua esposa. Assim começa a história do primeiro pajé da tribo kaingáng, o líder que protegerá seu povo de todas as ameaças e os guiará para uma vida de paz, sabedoria e harmonia com a natureza.

Raoni Metuktire

Líder indígena brasileiro da etnia caiapó, Raoni é conhecido internacionalmente por sua luta pela preservação da Amazônia e dos povos indígenas. Em 2010, Raoni publicou o livro “Raoni, mémoires d’un chef indien (Raoni, memórias de um chefe indígena).

Edson Krenak

Descendente do povo Krenak, o autor publicou em 2021 “O Sonho de Borum” vencedor do 10º Concurso Tamoios de Textos de Escritores Indígenas. 

Confira outras obras de autores indígenas:

Yaguarê Yamã

  • Kurumi Guaré no Coração da Amazônia

Kaka Werá Jecupé

  • A Terra dos Mil Povos: História indígena do Brasil contada por um índio 

Vários autores

  • Wamrêmê Za´Ra Nossa Palavra. Mito e História do Povo Xavante 

Julie Dorrico

  • Eu sou Macuxi e Outras Histórias