É impossível voltar no tempo. Essa simples frase parece óbvia para a maioria das pessoas, mas as ações humanas sobre o planeta Terra podem dar a sensação de que, em algum momento, será possível simplesmente retornar aonde erramos, corrigir e continuar vivendo normalmente. Assista à reportagem a seguir

Nós não só usamos e abusamos dos recursos disponíveis no planeta, como descartamos sem qualquer cuidado e colocamos em perigo as futuras gerações. Na série Repense, o Sistema Sagres já abordou sobre o destino dos resíduos sólidos, reciclagem, aproveitamento do lixo como energia, além de mostrar os problemas que o descarte incorreto de lixos hospitalares e eletrônicos podem causar ao Meio Ambiente.

Se é impossível voltar no tempo, também não podemos dizer que temos como avançar para o futuro sem viver o presente. Porém, diante dos avanços tecnológicos, cada vez mais impressionantes, uma outra sensação que podemos ter é a de que já estamos no futuro.

E, de fato, estamos, pois o futuro é daqui um segundo e, por isso, toda ação importa e precisa ser feita com rapidez. Se avançamos tanto, é o momento de usarmos a tecnologia para garantir que o próximo segundo seja sustentável.

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O professor e engenheiro sanitarista e ambiental Marlon Capanema afirmou que a tecnologia já tem sido usada para reduzir os impactos ambientais, na diminuição da geração e no gerenciamento de resíduos sólidos.

“Nós usamos a tecnologia para conseguir dados mais precisos e confiáveis sobre a geração dos resíduos sólidos, com softwares, hardwares e aplicativos de celulares”, explicou. Esse tipo de tecnologia também pode ser usado para reduzir o desperdício, ou seja, gerar menos resíduos.

“Então tem essa via da não geração, tem a via da reciclagem e do beneficiamento da responsabilidade compartilhada dos resíduos, na medida que você envolve e conecta, graças a tecnologia, o gerador de resíduos, o reciclador e a própria indústria da reciclagem e depois as pessoas que aproveitam o material reciclado em uma nova cadeia produtiva”, detalhou o professor.

Isso é uma amostra de como o avanço tecnológico relativo à reciclagem caminha com avanços em outras áreas. A possibilidade de compartilhar, através da conexão de várias instituições e grupos de pessoas, a mesma finalidade.

A bióloga Raquel Pires, coordenadora do Movimento Lixo Zero Goiás, chamou a atenção para essa facilidade na propagação das informações e ressaltou que é preciso usar esse tipo de tecnologia a favor da natureza.

“O Movimento Lixo Zero tem um projeto em Goiânia chamado Jornada Lixo Zero e uma das coisas que serão entregues à sociedade é um site, uma página na internet em que eles possam, através do CEP, encontrar todos os pontos de descartes corretos que existem em Goiânia”, projetou.

A informação difundida através das redes sociais é mais um ponto importante. “É dentro deste espaço que nós conseguimos encontrar mais sobre isso. Fazer a parte educacional, sobre como separar corretamente, sempre fazendo um link, para que as pessoas entendam que a economia e a produção do lixo têm que ser circular, não pode ser mais linear da forma que a gente produz hoje”, disse a bióloga.

Se a tecnologia avança e quem realmente quer a utiliza para cuidar do meio ambiente, é claro que também há criações feitas diretamente para transformar o consumo em algo mais sustentável.

“A tecnologia pode ajudar desde repensar as embalagens dos produtos, o que chamamos de redesign, até grandes projetos como a energia solar e os satélites. Tudo isso pode contribuir realmente para esse melhor desempenho ambiental”, declarou Raquel.

Formada em biologia, a instrutora de aprendizagem da Renapsi, Lorena Lima, também citou a mudança em produtos utilizados pelas pessoas.

“A tecnologia trouxe os canudos biodegradáveis, porque antes os canudos de plásticos afetavam os animais marinhos e também o solo, já que o plástico demora a se decompor. Os canudos biodegradáveis são uma tecnologia inovadora e torna o consumo mais sustentável. É uma das tecnologias. Nós temos diversas, por exemplo, para separação do lixo para fazer reciclagem. Tudo envolve algo tecnológico, dos mais simples aos mais avançados”, destacou a instrutora.

Lorena afirmou ainda que estamos acostumados a pensar na tecnologia associando-a a criação de robôs ou grandes máquinas, mas que coisas simples podem significar grande avanço para um mundo mais sustentável e ser tão inovador quanto as outras invenções.

“A questão da compostagem, por exemplo, que antes não tinha esse estudo e, também, foi criado uma tecnologia. Inovação também é pensar em novas formas de fazer a compostagem daquele lixo orgânico e a questão dos resíduos sólidos”, detalhou.

Produtos eletrônicos

A tecnologia ajuda, mas também pode ser problema. O descarte de pilhas, por exemplo, precisa ser feito da maneira correta, pois no local errado, faz mal ao ambiente em que for descartado.

Outro ponto importante são as baterias de celular. Agora, os aparelhos são trocados com certa frequência, o que aumenta o descarte desses materiais.

Pilhas e baterias são compostas por metais pesados como mercúrio, chumbo, níquel e cádmio. Esses elementos são tóxicos e podem afetar a saúde humana de diversas maneiras, atingindo órgãos como os rins, fígado, pulmões e o sistema nervoso central, além de também serem cancerígenos.

O descarte incorreto deste produto pode fazer esses metais chegarem ao lençol freático contaminando a fauna e flora da região.

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O engenheiro Marlon Capanema afirmou que há vários produtos, inclusive, alguns já estabelecidos em lei, como embalagens de agrotóxicos e eletroeletrônicos, que precisam ser destinados adequadamente.

“E a tecnologia ajuda muito, mapeando as pessoas geradoras e, em seguida, os fornecedores e comerciantes que precisam recolher esses resíduos eletrônicos para encaminhá-los ao destino final, porque é a fabricante que vai fazer isso”, esclareceu o professor.

Marlon alertou que, neste caso, é necessário conscientizar a população acerca do consumo, sobre a necessidade de trocar de aparelho com tanta frequência.

Outro ponto abordado pelo engenheiro é a falta de matéria prima para estes produtos, o que faz com que as empresas realmente precisam reaproveitar peças. Marlon afirmou que esse retorno dos aparelhos para as empresas é chamado de “logística reversa”.

Raquel Pires também mostrou preocupação com a troca exagerada de aparelhos eletrônicos e destacou outra variante dentro desta discussão, a obsolescência programada.

“É observar que sai o ‘celular XY’ e daqui a 20 dias sai o ‘XY 2.0 Plus’ e eles possuem pequenos avanços tecnológicos, sendo que as empresas já têm essa tecnologia muito avançada, então poderia ter lançado um celular com todos esses adereços uma única vez. Isso passa muito mais pelas mãos das indústrias e pela necessidade que elas têm de venda”, declarou a coordenadora do Movimento Lixo Zero.

A obsolescência programada pode ser descrita como um limite de vida mais curto para aparelhos eletroeletrônicos, na tentativa de fazer com que o consumidor tenha que realizar a troca por um mais novo com mais frequência.

Outra definição pode ser o constante lançamento de um produto mais novo, com poucas alterações relativas à última versão. Aparelhos smartphones, por exemplo, têm atualizações lançadas anualmente.

Para a instrutora da Renapsi Lorena Lima, o reaproveitamento é a grande chave para evitar que a tecnologia se torne problema e não solução. “A tecnologia é algo que veio para inovar, mas temos que pensar no descarte. Acredito que seja isso, o reaproveitamento, a reutilização de alguma forma desses produtos”, disse a instrutora.

Lorena afirmou que para um reaproveitamento de qualidade é preciso que o descarte seja feito de maneira correta e, a fim de facilitar, sugeriu que as empresas disponibilizem pontos de coleta dentro do seu espaço para os funcionários. “Seria uma saída para poder ter o descarte consciente”, pontuou.

Conscientização em todas as fases

O professor Marlon destacou que a conscientização de jovens, nativos digitalmente, é de vital interesse para a sociedade, pois eles enxergam soluções de acordo com o ambiente em que cresceram.

“O celular já faz parte dessa geração desde que eles são crianças e é mais fácil para eles entenderem sobre a importância do uso correto e o descarte deste tipo de material. As crianças de agora não passam por uma fase de transição como nós passamos, entre o analógico e digital”, disse Marlon.

O fato dos mais jovens serem multiplicadores também é um ponto positivo segundo o professor, pois levam o que aprendem para casa e repassam aos pais. Isso, aliado à conectividade dos mais jovens, traz um uso melhor de certas tecnologias. “Informação de coleta seletiva, com dias e locais marcados, chega a eles com facilidade”, analisou o engenheiro.

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A Conscientização dos mais jovens é uma semente que precisa ser plantada, segundo Lorena, para florescer como ações para o meio ambiente. “Eles podem desenvolver novas tecnologias, as mentes são criativas e eles já estão inseridos neste mundo tecnológico, então é mais fácil para pensar em algo novo, inovador, porque já nasceram digitais”, afirmou a instrutora.

Um outro ponto importante destacado por Lorena, é como o esclarecimento pode facilitar a compreensão do porquê algumas decisões são tomadas, como o projeto de Lei Nº 00150/2018, sancionado em junho de 2019 pelo então prefeito de Goiânia, Iris Rezende, que proibiu a distribuição de canudos de plásticos, que foram substituídos pelos novos canudos biodegradáveis, feitos, basicamente, de trigo e água.

“As pessoas têm um preconceito com essa questão mais biodegradável, mais sustentável. Para aceitação do público foi difícil porque falavam que o canudo derretia enquanto usavam, então a aceitação ocorreu por meio de lei. Então é a conscientização que a gente pode dar em escolas e as crianças levam para dentro de casa as informações, para os adultos e idosos”, explicou Lorena.

Ajuda aos países em desenvolvimento

Vivemos em um mundo globalizado. Um conflito entre a Rússia e Ucrânia, no Leste-Europeu, impacta no preço das mercadorias no Brasil, na América do Sul. Diante disso, é necessário que países desenvolvidos, além de criarem tecnologias para reduzir impactos ambientais, também possibilitem que o mesmo ocorra em países em desenvolvimento, como o Brasil.

“Os países em desenvolvimento têm a vantagem de ter uma matéria prima muito rica para se trabalhar uma boa gestão de resíduos sólidos, com aproveitamento, reciclagem, geração de energias elétricas e térmica. Porém tem o entrave financeiro e, também, a dificuldade da adesão de toda população. É preciso buscar financiamento externo para investir em tecnologias que se adequem à realidade brasileira”, detalhou o professor Marlon Capanema.

A questão do financiamento não fica de fora sequer de projetos como o Movimento Lixo Zero. Raquel contou que o site está em construção, mas que para ser finalizado é preciso de patrocínio. “É um dos objetivos, mas só será alcançado através de apoio. Acredito que até dezembro nós devemos disponibilizar o site. A plataforma já existe, mas ela não é adaptada para Goiânia, então nós temos que mapear os nossos pontos para depois inserir dentro dessa página”, contou.

Na próxima reportagem da série especial Repense, você vai conferir como os clubes de futebol adotam desenvolvimento sustentável como crescimento estratégico.

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