Um estudo inédito sugere que a expansão das hidrelétricas pode aumentar o risco de extinção de um cágado endêmico, ou seja, que vive somente em uma determinada área ou região geográfica. O trabalho já possui publicação na revista científica Journal of Applied Ecology (Jornal de Ecologia Aplicada, em português).
O estudo é de autoria do professor e pesquisador André Luis Regolin do Instituto de Ciências Biológicas, da Universidade Federal de Goiás (UFG). Para prevenir e mitigar os impactos, o trabalho classifica as futuras usinas hidrelétricas de acordo com seus efeitos adversos sobre a distribuição do cágado-rajado (Phrynops williamsi).
Essa espécie de cágado gosta de corredeiras e águas turbulentas, ou seja, alto fluxo d’água. Por isso, as águas paradas de represas que acompanham as hidrelétricas, sejam elas grandes ou pequenas, representam uma sentença de morte à espécie.
De acordo com os pesquisadores, para se ter uma ideia, em menos de dois meses após a construção de uma barragem, a espécie some dos reservatórios. Ou seja, o cágado-rajado é incapaz de sobreviver em águas represadas, lentas e muito profundas.
Planejamento e redução de impactos
Segundo Regolin, o trabalho é o primeiro a abordar de modo integrado os impactos de hidrelétricas sobre o cágado-rajado. “Os resultados poderão auxiliar no planejamento da redução dos impactos da expansão hidrelétrica sobre o cágado-rajado. O mesmo método pode ser aplicado para o estudo de outras espécies ameaçadas por empreendimentos do setor elétrico”, afirma.
A conclusão dos pesquisadores se deu, porém, a partir de modelos de nicho ecológico que estimaram a distribuição da espécie. Em seguida, compararam a distribuição do cágado-rajado com as usinas hidrelétricas atuais e planejadas no Brasil. Além disso, o estudo verificou se as localizações das usinas hidrelétricas coincidem com áreas de alta adequabilidade dos animais.
O trabalho identificou ainda áreas prioritárias para a conservação da espécie nos locais onde estão planejadas novas usinas hidrelétricas. O estudo se baseia em uma análise integrativa de modelos de nicho ecológico bem como a conectividade hidrológica.
Por fim, os cientistas avaliaram o risco de extinção da espécie em vários níveis.
Resultados
De acordo com os resultados, o estudo demonstra que as usinas hidrelétricas sobrepõem áreas de alta adequabilidade para o cágado-rajado. Esse processo ocorre independentemente do tipo ou estágio de licenciamento.
Além disso, as diferenças nos impactos adversos entre os tipos de usina hidrelétrica foram determinadas pela área afetada e pelo grau de interrupção na conectividade.
No futuro, conforme o estudo, a área impactada por pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) será quase igual àquela das grandes usinas hidrelétricas (UHEs). Atualmente, elas têm os maiores impactos na espécie do cágado-rajado.
“Acredito que a publicação é uma importante contribuição para a conservação do cágado-rajado. Revelamos o padrão geral dos impactos cumulativos dos empreendimentos sobre a distribuição da espécie, o que era urgente. Os resultados têm alto potencial de aplicação para subsidiar tomadas de decisão relacionadas à expansão da matriz hidrelétrica. Porém, ainda há muito a ser feito. Existem diversas lacunas de conhecimento sobre o cágado-rajado. Será necessário investimento em pesquisa de ponta para poder avançar com propostas concretas para sua conservação”, acrescenta Regolin.
Sustentabilidade ambiental
A análise, segundo o professor, pode ser uma ferramenta complementar para orientar decisões sobre a sustentabilidade ambiental de usinas hidrelétricas. Ademais, o trabalho pode revelar os padrões de impactos cumulativos dos empreendimentos em espécies fluviais e ecossistemas de água doce. Desta forma, o trabalho subsidia o planejamento de fornecimento de energia sustentável.
Além de André Luis Regolin (UFG), o estudo foi produzido pelos pesquisadores Raíssa Bressan (era pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, o estudo é também uma homenagem in memorian a ela), Tobias Kunz (UFRGS), Felipe Martello (UNESP), Ivo Rholin Ghizoni-Jr (UFSC, Florianópolis, SC), Danilo José Vieira Capela (Grimpa Consultoria Ambiental, Curitiba, PR) Jorge José Cherem (Instituto Tabuleiro, Florianópolis, SC), Luiz Gustavo R. Oliveira Santos (UFMS), Rosane Garcia Collevatti (UFG) e Thadeu Sobral-Souza (UFMT).
Com informações do Jornal UFG
Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU) ODS 11, 14 e 15 e 16 – Cidades e comunidades sustentáveis, Vida na água e Vida terrestre, respectivamente.
Leia mais
Educação ambiental conscientiza preservação dos parques urbanos e reforça pertencimento à cidade
COP 30: Belém recebe primeira reunião técnica para Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas