A Lei 14.026/20 resultou em atualizações significativas no Marco Legal do saneamento básico, sendo a mudança mais relevante a permissão para que empresas privadas também possam atuar nesse setor. No entanto, recentemente, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou decretos que modificaram o Marco, mesmo após sua aprovação pelo Congresso.

Algumas dessas mudanças foram contestadas e anuladas pela Câmara dos Deputados esta semana, embora estejam atualmente sob análise do Supremo Tribunal Federal. O professor titular da Escola de Comunicações e Artes (ECA) e do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da USP, Pedro Luiz Côrtes, detalha as principais modificações implementadas pelo decreto presidencial.

“No caso do decreto 11466, ele flexibilizou a comprovação da capacidade financeira das concessionárias, ao permitir que elas incluam no processo de comprovação dessa capacidade eventuais situações de prestação dos serviços por meio de contratos provisórios não formalizados ou de contratos, instrumentos ou relações irregulares ou de natureza precária, ou seja, ele tentou ampliar a possibilidade de participação de empresas públicas que antes não conseguiriam participar das licitações pela falta de capacidade financeira”, afirma em entrevista ao Jornal da USP.

Pedro Luiz Côrtes – Foto: Reprodução/Câmara São Paulo

Outra mudança introduzida pelo decreto foi a permissão para que empresas públicas de saneamento, sem a necessidade de licitação, possam prestar serviços em regiões metropolitanas. “A votação da Câmara, derrubando diversos itens dos dois decretos [11466 e 11467], trouxe a preocupação para as estatais sobre o futuro dos diversos contratos irregulares que teriam recebido uma segunda chance”, pontua.

Consequências

Tanto empresas públicas quanto privadas encontram-se em incerteza quanto ao futuro da prestação dos serviços essenciais de saneamento nessa situação. “Os dois decretos criaram uma série de confusões em relação ao marco do saneamento e isso trouxe uma instabilidade grande para o mercado, tanto empresas estatais quanto privadas estão sem saber exatamente como o Marco vai ficar daqui para frente por conta dessas alterações”, destaca.

O professor acrescenta que os decretos não foram completamente revogados, mas apenas em partes, o que aumenta ainda mais a incerteza em relação ao futuro das políticas de saneamento. Côrtes enfatiza que os decretos por si só não são suficientes para alterar uma lei.

“O governo foi além de uma simples regulamentação. Ele alterou pontos importantes do marco do saneamento; você não pode derrubar ou alterar substancialmente uma lei por meio de um decreto, você teria que fazer alteração por meio de uma outra lei”, diz.

“Elas avaliam que essa discussão no Congresso inclusive poderá trazer mais problemas do que soluções, porque há o risco de que novas mudanças sejam acrescentadas ao Marco Legal e, por outro lado, o governo federal já estaria estudando uma medida provisória para retomar as medidas que foram derrubadas. O problema que eu vejo é que os decretos, a judicialização e a falta de uma base ampla do governo tendem a estender essas discussões e paralisar o setor de saneamento”, completa sobre empresas privadas.

*Esse conteúdo está alinhado com o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU 06 – Água Potável e Saneamento

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