A notícia de que o Sul da Ásia, Golfo Pérsico, China e Brasil ficarão inabitáveis em 50 anos deixou muita gente apreensiva. A informação circulou na mídia associada a um estudo da Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço (Nasa), publicado na revista científica “Science Advances“, em 2020. O especialista em Gestão Ambiental e Desenvolvimento Sustentável, André Maciel Pelanda, comentou a informação.

“Essas projeções climáticas levantam possibilidades de algumas regiões do planeta Terra se tornarem inabitáveis, no entanto essas projeções não significam necessariamente que esses cenários podem se concretizar. Eles se constituem como uma possibilidade”, disse.

O título do estudo é “O surgimento de calor e umidade muito severos para a tolerância humana”. Entretanto, segundo informação do portal do G1, a pesquisa não cita o Brasil e também não diz que regiões do mundo se tornarão lugares inabitáveis.

O que diz o estudo?

Terra registra o primeiro semestre mais quente da história (Foto: Carlos Bassan/Prefeitura de Campinas)
Terra registra o primeiro semestre mais quente da história (Foto: Carlos Bassan/Prefeitura de Campinas)

Os pesquisadores não projetaram um cenário para 2027, mas apenas analisaram os dados históricos entre 1979 e 2017. Além disso, o estudo é sobre a temperatura do bulbo úmido e não a temperatura dos termômetros que sentimos no dia a dia. Ao observar a temperatura do bulbo, os pesquisadores conseguem medir o estresse térmico pelo calor e a umidade do ar.

“A temperatura do bulbo úmido leva em consideração a umidade relativa que faz com que o efeito dessa temperatura no organismo seja diferenciada, sendo uma métrica importante que indica as condições de evaporação do corpo. Ela acaba, por exemplo, não sendo suficiente para resfriar o corpo, o que gera consequências para a saúde. E em situações extremas as pessoas podem vir a óbito”, explicou André.

Ao analisar os resultados da pesquisa, a Nasa indicou que a Terra já atingiu o limite dessa temperatura, que é de 35°C no bulbo, em alguns eventos climáticos extremos. Assim, a pesquisa apontou o alcance do limite da temperatura, mas não indicou regiões do mundo futuramente inabitáveis. Mesmo assim, André Pelanda destacou um local do planeta que já vive essa situação.

“Nós temos algumas situações que já ocorrem no planeta Terra com essas características, um exemplo é o vale da morte nos Estados Unidos, que é uma região praticamente inabitável por conta das suas características climáticas. É um local que apresenta uma temperatura muito alta e umidade muito baixa e que, consequentemente, a vida humana se torna praticamente impossível”, citou.

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E o Brasil?

As mudanças climáticas estão se agravando em todo o mundo. Elas causam eventos climáticos extremos, alteram o padrão de precipitações, o aumento do nível do mar, a perda de biodiversidade e a acidificação dos oceanos. Tudo isso em relação à natureza e que, então, impacta diretamente a saúde humana e sua sobrevivência socioeconômica.

Portanto, o aquecimento global é uma realidade de todos os países do mundo. Porém, o Brasil entrou nessa história de locais inabitáveis em 50 anos no ano de 2022. Dois anos após a publicação na Science Advances, a Nasa publicou um artigo sobre a pesquisa, em que o texto contou com uma entrevista com o autor principal do estudo, Colin Raymond.

O artigo de 2022 é sim sobre locais ficarem muito quentes a ponto de impossibilitar a vida humana. Na entrevista, Raymond disse que é difícil prever que a temperatura do bulbo fique em 35°C, mas citou modelos climáticos que indicam que alguns locais do mundo podem exceder essa temperatura em 30 ou 50 anos.  Então, citou Ásia, Golfo Pérsico e o Mar Vermelho, China e Brasil como locais em que as temperaturas podem chegar a esses níveis.

Consequências das temperaturas

Recordes de calor (Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil)
Recordes de calor (Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil)

André Pelanda disse que a temperatura ideal do bulbo para as condições humanas ideal é um pouco acima dos 30°C. “Estudos sugerem que a temperatura do bulbo úmido de 35°C é o limite de tolerância humana para uma exposição ao calor mais prolongada, sendo que nesse caso o corpo humano não consegue manter uma regulação térmica adequada, podendo gerar consequências bastante graves devido ao aumento da temperatura corporal. Em situações, por exemplo, em que nós temos uma baixa umidade do ar, essa temperatura acaba sendo tolerada até 40°C”, afirmou.

Segundo o especialista, acima dessa temperatura as pessoas mais vulneráveis como idosos, crianças e pessoas com algum tipo de limitação de saúde sofreriam consequências mais sérias. 

“Principalmente em relação a desidratação. Então, nesse sentido, é importante que essas pessoas evitem se expor a condições bastante extremas para evitar consequências impactantes a sua saúde”, destacou.

Recordes frequentes

Calor (Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)
Calor (Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)

O planeta quebrou o recorde mensal de temperaturas de junho de 2023 a junho de 2024, o que significa que os 13 meses no período são os mais quentes já registrados na história. Os dados são da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA) dos Estados Unidos e do observatório europeu do clima, o Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus.

Segundo o Copernicus, a Terra registrou o dia mais quente já visto no mundo no domingo, 21 de julho, com 17,09°C. Mas dados preliminares do observatório europeu indicam que esse recorde ficou para trás já no dia seguinte, com o registro da temperatura média global diária de 17,15°C, em 22 de julho. 

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Antes do período recente de recordes, segundo o NOAA, o dia mais quente do ano havia sido em 3 de julho de 2023, com a temperatura média global de 17,01ºC. O recorde imediatamente anterior era de 16,92° C, registrado durante agosto de 2016. O especialista comentou o curto tempo para a quebra do recorde.

“Essa rapidez vem acontecendo em função das alterações climáticas. É uma consequência imediata desse processo, sendo que se não forem tomadas providências em relação às emissões de dióxido de carbono, que é um dos principais gases que geram o agravamento do efeito estufa, nós tenhamos situações semelhantes também nos próximos anos”, destacou Pelanda.

Metas de mitigação

COP da ONU (Foto: Flickr/UNclimatechange)

André Pelanda afirmou que o Brasil pode ter consequências como as enchentes do Rio Grande do Sul e a seca histórica na região amazônica. Além disso, ele destacou que as cidades litorâneas do país podem sofrer com o aumento do nível do mar.

Por isso, o especialista em Gestão Ambiental e Desenvolvimento Sustentável e docente do Centro Universitário Internacional (Uninter) avaliou positivamente os encontros internacionais, como as reuniões anuais da Organização das Nações Unidas e de grupos como o G20.

“Esses eventos são importantes para o estabelecimento de metas. E é a partir dessas metas que os países podem trabalhar para a redução das emissões dos gases que geram o efeito estufa e atingir as outras metas da Agenda 2030”, disse.

No entanto, André Pelanda acredita que o mundo ainda está na fase de discussões sobre como alcançar os objetivos e que “ainda há muito a ser feito”. “O passo inicial vem com o estabelecimento de metas para posteriormente entrar em ação. E então reduzir as ações negativas que acabam impactando o meio ambiente, a vida humana e suas questões sociais”, finalizou.

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). Nesta matéria, o ODS 13 – Ação Global Contra a Mudança Climática.

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