O governo brasileiro anunciou a criação do Fundo Amazônia durante a 13ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática (UNFCCC), em 2007, na Indonésia. No entanto, a oficialização só ocorreu no ano seguinte. A professora e especialista em geotecnologias e meio ambiente, Franciele Estevam, afirmou que a iniciativa foi uma novidade no monitoramento e proteção de florestas.

“O Fundo Amazônia é uma iniciativa pioneira de financiamento, tanto em ações para reduzir as emissões provenientes de desmatamento quanto a degradação ambiental”, explicou.

O objetivo do fundo é captar recursos para prevenção, combate e monitoramento do desmatamento. Além de promover a conservação e o uso sustentável da Amazônia Legal. O decreto 6.527 criou o mecanismo e estabeleceu que a gestão dos recursos é do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

“O BNDES é o responsável pela gestão do fundo e, assim, recebe doações voluntárias para aplicação não reembolsável em ações dentro da área da Amazônia Legal. Então, 20% dos recursos são destinados ao desenvolvimento de sistemas de monitoramento e os outros 80% em ações de prevenção e combate ao desmatamento efetivamente. Por isso é uma ação pioneira no âmbito de proteção das florestas”, ressaltou a especialista.

Recursos

Amazônia
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

A captação de recursos pelo BNDES se dá apenas por doações não reembolsáveis. Segundo o Relatório de Atividades do Fundo Amazônia, essa captação “está condicionada à redução das emissões de carbono oriundas do desmatamento”. Sendo assim, o país precisa comprovar para os doadores a redução do desmatamento na Amazônia para atrair novos recursos.

“É um mecanismo de captação baseado nos resultados que são alcançados pelo Brasil na redução de emissões de carbono oriundos de desmatamento e da degradação florestal. E também por isso obteve tanto sucesso. No período de 2014 a 2018, por exemplo, tiveram várias ações que culminaram em 72% de redução de desmatamento na área da Amazônia”, destacou Franciele. 

Até 2019, o Fundo Amazônia distribuía recursos captados de dois países voluntários e uma empresa. “Os principais doadores eram a Noruega com pouco mais de 90% de doação; 0,5%, mais ou menos, era da Alemanha e uma parcela um pouco menor vinha pela Petrobras. Então esses são os principais doadores desse fundo”, disse Franciele Estevam.

O Ministério das Relações Exteriores da Noruega começou a doar para o fundo em 2009 e a Alemanha fechou contrato em 2010. E a Petrobras doa desde 2011, como medida obrigatória imposta pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) de apoiar projetos de neutralização de carbono e emissão de gases de efeito estufa provocados por suas atividades. 

“Esses são os principais doadores que destinam recursos em compensação financeira para estar promovendo a manutenção das florestas em várias frentes de atuação e vários projetos que são elaborados dentro do Fundo Amazônia”, disse a professora.

Atividades de 2021

O Relatório de Atividades do Fundo Amazônia é publicado anualmente para dar transparência à utilização dos recursos captados e apresentar os resultados das ações apoiadas. Conforme os dados das atividades de 2021, o fundo já captou R$ 3,4 bilhões em doações desde a sua criação. A divisão dos recursos entre os doadores é de 93,8% com origem da Noruega, outros 5,7% da Alemanha e 0,5% da Petrobras. 

Dados do relatório de 2021

Ainda segundo os dados de 2021, dos R$ 3,4 bilhões captados, foram usados R$ 1,8 bilhões em apoio de ações e outros R$ 1,4 bilhões foram desembolsados diretamente para projetos. Desta forma, nesses 14 anos de atuação, o Fundo Amazônia já apoiou 102 projetos, sendo 61% do setor público, 38% do terceiro setor e 1% internacional.

O relatório de 2021 apresenta apenas dados gerais dos 13 anos da atuação do fundo até aquele ano. Isso porque a Noruega e a Alemanha suspenderam seus repasses em 2019, em virtude de mudanças na gestão do fundo pelo Governo Federal. 

Em 2019, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) revogou diversos comitês da estrutura de governança da administração pública federal. Com isso, o decreto 9.759 revogou o Comitê Técnico do Fundo Amazônia. E o decreto 10.223 extinguiu o Comitê Orientador do Fundo Amazônia (COFA), que era responsável pelas diretrizes de aplicação dos recursos e aprovava o Relatório Anual de Atividades do Fundo.

Interesse

O que faz com que países como Noruega e Alemanha invistam altos valores num fundo brasileiro não reembolsável? O investimento norueguês, por exemplo, já superou os R$ 3 bilhões e corresponde a 93,8 % das doações captadas, conforme o relatório de atividades de 2019. A professora de geociências, Franciele Estevam, explicou que o interesse é a sobrevivência no território deles.

“A Noruega destina os recursos pensando na sobrevivência no território dela, porque é próximo à Groenlândia e a gente tem um aumento do aquecimento global e o derretimento das calotas polares. E a Amazônia é uma grande floresta de expressão singular mundial. Então eles destinam esse dinheiro com o intuito de promover a redução da emissão dos gases de efeito estufa e do desmatamento também, para que diminua o reflexo do aquecimento global no território dela”, contou. 

No caso da Alemanha, a especialista afirmou que é uma parceria que já existe desde a década de 60  com o Brasil em diversos projetos relacionados à questão ambiental. “Nesse caso, eu acredito que seja com relação a atingir a meta de redução de emissões. Então é claro que tem um objetivo, mas é em relação a questão climática e ambiental”, detalhou a especialista.

Confira o Relatório de Atividades do Fundo Amazônia de 2021

Importância 

O fundo se tornou um importante mecanismo de captação de recursos para combater o desmatamento na Amazônia Legal. Sem esse financiamento, Franciele Estevam acredita que o país não teria capacidade para combater os problemas ambientais na região amazônica como os conhecemos atualmente.

“Eu tenho certeza que não conseguiria porque quando o Fundo na Amazônia foi suspenso em 2019 e os recursos ficaram congelados, houve um aumento do desmatamento na região amazônica no período. Então, o fundo é crucial para essas ações de manutenção da floresta e sem ele fica difícil manter a redução do desmatamento, a emissão de gases, e a preservação dos recursos florestais”, disse.

Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

Os principais repasses do Fundo Amazônia ficaram suspensos até o fim da gestão de Bolsonaro. Porém, um dos primeiros decretos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi estabelecido para retomar as atividades do Fundo Amazônia. 

Atividades

Especialista em geotecnologias e meio ambiente, Franciele Estevam afirmou que é possível fazer uma comparação de como o fundo é muito importante para combater o desmatamento na  região da Amazônia com dados e estudos de diversas instituições. “Um estudo da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) traz uma análise do desenvolvimento do Fundo Amazônia até 2018 em comparação com o período de início das atividades em 2008. Neste período, então, foi constatada uma redução de 78% dos índices que tinha no fim da década de 2000”, pontuou Estevam.

A professora também avaliou que o aumento de atividades ilegais na região amazônica foi constatado em estudos após a suspensão dos recursos em 2019.  “Temos alguns dados do Inpe que constatam, às vezes por imagens de satélites. E já há estudos com as análises do Inpe, do MapBiomas, que também divulga informações a respeito. Então dá pra fazer essa análise dos percentuais e a gente consegue constatar essa efetividade do Fundo Amazônia. Então, apesar de algumas críticas em relação a gestão, eu acredito que é um fundo muito assertivo”, disse Estevam.

Todos ganham

Foto: Marcelo Cadilhe/A Crítica

O lema do Fundo Amazônia é “O Brasil cuida. O mundo apoia. Todos ganham. Com isso, os recursos do Fundo Amazônia não são distribuídos somente para projetos e ações na região da Amazônia Legal. Segundo Franciele Estevam, as doações podem abranger o Brasil todo, como num projeto contra o  desmatamento no Cerrado, e em outras partes do mundo, dependendo da abertura do tipo de projeto.

“No Cadastro Ambiental Rural (CAR) tem um projeto dentro de cada estado que é para a implantação de um cadastro rural que vai auxiliar no combate ao desmatamento. Então a gente tem essas ações espalhadas pelo Brasil todo e não só focado na região amazônica. Mas  claro que a principal é a região amazônica”, exemplificou.

Segundo dados do próprio Fundo Amazônia, mais de 1,1 milhão de residências estão inscritas no cadastro rural. Além disso, os recursos do fundo apoiam um projeto no exterior, que representa 1% na distribuição ‘Internacional’ por setores.

Após o restabelecimento do Comitê Orientador do Fundo Amazônia, Alemanha e Noruega retornaram a realização dos repasses que estavam suspensos. Além disso, o Reino Unido, a França, a União Europeia e os Estados Unidos estudam a possibilidade de integrar os países que doam voluntariamente para o Fundo Amazônia. Essa ação remete ao cumprimento do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 13 – Ação Contra a Mudança Global do Clima, que visa tomar medidas urgentes para combater a mudança do clima e seus impactos.

Projeto de Lei

Em 2021, a Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado Federal aprovou um projeto de lei para oficializar a criação do Fundo Amazônia. O autor da proposta, senador Jorge Kajuru (Podemos-GO), justificou no texto que o fundo “tem um papel importante na luta pela preservação do meio ambiente” e que estava “sob ataque do Governo Federal” à época.

Franciele Estevam explicou que essa legislação federal representa uma segurança jurídica para a gestão das atividades do fundo. “A questão de transformar o decreto em lei é para que mantenha-se essas ações independente das mudanças das gestões de governo”, afirmou a especialista.

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