Um estudo brasileiro comprova que o novo coronavírus é capaz de infectar células do tecido cerebral, e detalha também os efeitos do vírus nas células nervosas. É o que explica a doutoranda do Laboratório de Neuroproteômica da Unicamp-SP, Fernanda Crunfli.

“A gente analisou imagens de ressonância magnética de pacientes que foram infectados pelo Sars-Cov-2 e apresentaram sintomas leves, e a gente observou que esses pacientes apresentaram alterações no córtex, que é uma região muito importante para memória, atenção e linguagem”, afirma.

Segundo Fernanda Crunfli, foram observados também cérebros de pacientes acometidos pela Covid-19 que acabaram falecendo em função da doença.

“A gente viu a presença do vírus no cérebro desses pacientes, e viu que o vírus é capaz de infectar as células do sistema nervoso e a principal célula que ele infecta é o astrócito, que tem a função no sistema nervoso de dar um suporte metabólico para o neurônio”, afirma. “O vírus é capaz de se replicar no astrócito”, complementa.

Os astrócitos são as células mais abundantes do sistema nervoso central e desempenham funções variadas: oferecem sustentação e nutrientes para os neurônios; regulam a concentração de neurotransmissores e de outras substâncias com potencial de interferir no funcionamento neuronal, como o potássio; integram a barreira hematoencefálica, ajudando a proteger o cérebro contra patógenos e toxinas; e ajudam a manter a homeostase cerebral.

Ainda de acordo com Fernanda Crunfli, apesar dos primeiros resultados do estudo, ainda há incertezas sobre o que causa de fato os sintomas.

“A gente ainda não sabe se esses sintomas neurológicos são decorrentes de uma ação direta da infecção do vírus no sistema nervoso, ou se seria uma ação secundária devido à infecção toda que o vírus causa no corpo humano”, pondera.

Em outro braço da pesquisa, conduzido na Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, exames de ressonância magnética foram feitos em 81 voluntários que contraíram a forma leve da COVID-19 e se recuperaram. Em média, as avaliações presenciais ocorreram 60 dias após a data do teste diagnóstico e um terço dos participantes ainda apresentava sintomas neurológicos ou neuropsiquiátricos. As principais queixas foram dor de cabeça (40%), fadiga (40%), alteração de memória (30%), ansiedade (28%), perda de olfato (28%), depressão (20%), sonolência diurna (25%), perda de paladar (16%) e de libido (14%).

Foram incluídas na pesquisa somente pessoas que tiveram o diagnóstico de COVID-19 confirmado por RT-PCR e que não precisaram ser hospitalizadas. As avaliações foram feitas após o término da fase aguda e os resultados foram comparados com dados de 145 indivíduos saudáveis e não infectados.

Pela análise dos exames de ressonância magnética foi possível perceber que algumas regiões do córtex dos voluntários tinham espessura menor do que a média observada nos controles, enquanto outras apresentavam aumento de tamanho – o que, segundo os autores, poderia indicar algum grau de edema.

Nos testes neuropsicológicos – feitos para avaliar as funções cognitivas – os voluntários do estudo também se saíram pior do que a média dos indivíduos brasileiros em algumas tarefas. Os resultados foram ajustados de acordo com a idade, o sexo e a escolaridade de cada participante. Também foi considerado o grau de fadiga relatado pelo participante aos pesquisadores.

A pergunta que fica agora é: serão esses sintomas passageiros ou permanentes?

Assista à entrevista a seguir a partir de 02:25:00

Com informações da Agência Fapesp