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A terceirização de todas as atividades de uma empresa, a qual foi considerada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na última quinta-feira (30), não permite a contratação de empregados diretamente subordinados como Pessoa Jurídica (PJ) ou que empresas sejam abertas apenas para intermediar mão de obra. O alerta é do procurador Murilo Muniz, do Ministério Público do Trabalho (MPT), que acompanhou as sessões do supremo. “[A terceirização] não autoriza fraude”, disse à Agência Brasil.

Muniz explicou que a intermediação de mão de obra é vedada por ser considerada “comércio de pessoas” e fere, portanto, os princípios internacionais do direito do trabalho. “É justamente essa hipótese de colocar um mero intermediário com a finalidade de precarizar direitos, isso continua proibido”, destacou. O MPT tinha posição contrária à liberação para atividade-fim, pois entende que, na prática, ela se confunde com essa intermediação.

Para o procurador, a “pejotização”, como é conhecida a prática de contratação de um funcionário via PJ, facilitada por meio do registro de Microempreendedor Individual (MEI), também deve ser combatida. “Qualquer que seja a roupagem formal da relação, se tiverem presentes os requisitos dos artigos 2 e 3 da CLT [Consolidação das Leis do Trabalho] ou tiver expediente para fraudar ou precarizar direitos, a liberação da terceirização pelo Supremo não afasta a possibilidade de se combater a fraude e, se tiver subordinação e pessoalidade, se declarar o vínculo empregatício”.

O sociólogo do trabalho Ruy Braga, professor da Universidade de São Paulo (USP), é mais pessimista quanto aos limites da terceirização irrestrita. “Potencialmente ela, agora, atinge a todos, tanto setor privado quanto público, e consequentemente, o que nós prevemos é uma alteração da estrutura do mercado de trabalho no país com substituição progressiva, porém certeira, de trabalho diretamente contratado por trabalho terceirizado”, destacou. Ele estima que a proporção entre trabalho diretamente contratado e terceirizado, que hoje é de 75% e 25%, deve se inverter em cerca de 5 anos.

Braga é crítico à mudança pelas características do trabalho terceirizado verificadas atualmente. “É um tipo de trabalho muito conhecido pela literatura especializada, que tende a ser fatalmente pior remunerado, submetido a jornadas mais longas e tende a afastar o trabalhador de certos direitos ou benefícios [como férias e décimo terceiro salário]”, justificou. Ele avalia que poucas categorias conseguiram resistir às mudanças decorrente da terceirização. “Por enquanto estamos falando do subemprego como informalidade, mas logo teremos o aumento do subemprego como trabalho terceirizado e precário”, disse.

Sindicatos

Para Ivo Dall’Acqua, vice-presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), a liberação da terceirização é positiva, pois põe fim à incerteza jurídica em torno do tema. Ele avalia que não é possível estimar aumento na oferta de vagas de emprego. “A gente precisa de um pequeno ciclo de memória para poder medir os efeitos, mas o ambiente que se criou é que é muito interessante”, disse. Ele acredita que a medida deve aumentar a formalidade no mercado de trabalho.

Graça Costa, secretária nacional de Relações do Trabalho da Central Única dos Trabalhadores (CUT), avalia que a liberação da terceirização trará impactos negativos para a economia. “Se vamos ter redução de pelo menos 25% da massa salarial dos trabalhadores, pois fizemos um estudo que mostrou que terceirizados ganham pelo menos salários 25% menores em relação aos diretamente contratados. Se vamos ter terceirização generalizada, vamos ter, no mínimo, 25% de rebaixamento da massa salarial, isso vai ter impacto na economia do país”, disse. Ela destacou também impactos na Previdência Social, pela diminuição da arrecadação.

Um estudo divulgado em 2014 pela CUT e pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), apontou que os trabalhadores terceirizados, que somavam cerca de 12,7 milhões de indivíduos (6,8%) do mercado de trabalho em 2013, recebiam, em dezembro daquele ano, 24,7% a menos do que os que tinham contratos diretos com as empresas, tinham uma jornada semanal de três horas a mais e estavam mais suscetíveis a acidentes de trabalho.

A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) comemorou a decisão do STF, pois, na avaliação da entidade, “reconheceu como lícita esta forma moderna de contratação, que já é utilizada no resto do mundo como um modelo de negócio e uma alternativa de organização de empresas que buscam por especialização de serviços”.

A Força Sindical, por sua vez, qualificou a liberação da terceirização como “lamentável e nefasta”. “Ao acabar com os direitos pactuados, regidos por uma convenção coletiva em cada atividade profissional, ela cria trabalhadores de segunda categoria, sem o amparo de uma legislação específica”, disse em nota a central sindical. Para a entidade, a terceirização irrestrita impede que trabalhadores acessem direitos como participação nos lucros ou resultados, vale-transporte e vale-alimentação.