Um assalto no estilo novo cangaço chamou a atenção do país na madrugada da última terça-feira (1°) em uma verdadeira cena de filmes de ação. Trinta pessoas encapuzadas assaltaram uma agência do Banco do Brasil no Centro de Criciúma. A ação durou uma hora e 45 minutos. Pessoas foram feitas reféns e cercadas por criminosos. Houve bloqueios e barreiras para conter a chegada da polícia.

A Rádio Eldorado Criciúma registrou ao vivo boa parte da ação dos criminosos, em entrevista à Sagres 730, o locutor da emissora, Dante Bragatto Neto detalhou a movimentação dos criminosos na cidade e a participação do público na coleta das informações.

“Foi uma situação terrível, acima de tudo passar por uma situação como essa é constatar o tamanho da fragilidade da nossa segurança, como as nossas cidades são frágeis. Criciúma é uma cidade de aproximadamente 210 mil habitantes e não está acostumada com esse tipo de situação, nós tivemos aqui um assalto a banco em 2003. Foi um assalto durante o dia, em que os criminosos estavam em um ou dois carros no máximo e naquela oportunidade dois policiais acabaram sendo mortos pelos bandidos. E essa ação foi cinematográfica!”, declarou. 

A rádio Eldorado fica perto do batalhão da Polícia Militar, a aproximadamente 300 metros. Na noite do crime, Dante estava apresentando seu programa diário, Companhia da Noite, que vai ao ar de segunda a sexta-feira, das 22 horas à meia noite. Por volta das 23h45 o radialista foi a cozinha tomar água e ouviu os primeiros tiros. 

“Entrei no estúdio e falei com meu operador de áudio: Olha, escutei tiros aqui na frente! Ele voltou lá para dar uma olhada e escutamos vários tiros de metralhadora, mas achamos que era a polícia perseguindo alguém”, relembrou.

Ao encerrar o programa, Dante e o operador de áudio se aproximaram da porta da recepção da emissora e constataram que eram vários tiros. 

“Imediatamente voltamos para o estúdio e reabrimos o microfone e começamos a transmitir, de imediato acionamos nossos repórteres que moram na região central da cidade e eles foram nos relatando tudo o que acontecia. Os ruídos dos tiros de metralhadora e as rajadas dos fuzis nós ouvíamos perfeitamente e os nossos ouvintes também. Abrimos nossos telefones para que os ouvintes nos ligassem e foi uma situação de desespero”, revelou. 

Além dos repórteres, a rádio também abriu os telefones e o whatsapp para que os ouvintes pudessem trazer relatos e informações sobre o que estavam presenciando. 

“A primeira participação foi de uma moça que trabalha na central de telefones da Polícia Militar no Batalhão, que é um cargo ocupado por civis e lá também têm uma base do Samu. Essa moça estava chorando desesperadamente, pedindo socorro, pedindo orações, porque o Batalhão estava sendo atacado e eles não sabiam do que se tratava. O Batalhão da PM e a Rádio Eldorado ficam no máximo a 2 quilômetros de distância do centro da cidade, onde estavam a maioria dos criminosos. Eles fecharam vários pontos de entrada, não tinham como chegar lá no centro”, contou.

“Nossos repórteres e ouvintes nos traziam informações a todo instante, eram relatos assustadores e desesperadores de pessoas que estavam ali, próximos, há dez, quinze metros. E nós ficamos no ar informando de forma ininterrupta o que estava acontecendo”, continuou. 

“Por volta de 01h15 da manhã, Dante recebeu um comunicado de um colega: “Saiam daí, porque as pessoas estão ouvindo eles dizerem que vão invadir a rádio” 

O radialista achou estranho e não acreditou que em uma ação como essa os criminosos estivessem ouvindo rádio. No entanto, os avisos continuaram e, Dante recebeu três mensagens dizendo que os bandidos pretendiam invadir a rádio, porque a transmissão estava divulgando muitas informações e detalhes sobre a ação. 

“Ainda sim, eu fiquei imaginando que era trote, gozação de quem queria atrapalhar o nosso serviço. Na sequência uma pessoa ligou no telefone e disse: Parem a transmissão, nós vamos invadir!”.

A ligação foi recebida no telefone fixo da emissora, por isso não foi para o ar. Dante salienta que não é possível afirmar se era mesmo um dos bandidos, mas a ligação aconteceu. 

“Ligamos para o nosso diretor que era um dos que estavam no centro da cidade trazendo as informações e, ele disse: Por questão de segurança, interrompam a transmissão”.   

Após interromper a transmissão os jornalistas não podiam sair da rádio, por conta proximidade com o Batalhão, certamente havia um grupo de bandidos perto do local para impedir a saída da Polícia Militar. 

“Eu apaguei todas as luzes da recepção da rádio, uns três minutos depois que nós estávamos ali nos protegendo com as luzes apagadas, notamos a aproximação de um carro preto, grande, que passou muito devagar no local que dá acesso a rádio. Depois se dirigiu a mais ou menos uns cem metros onde têm um retorno em um posto de gasolina, retornou e passou de novo”, relatou Dante. 

“Aí nós nos assustamos porque como nós já havíamos recebi muitos vídeos das ações dos bandidos, notamos que era um veículo dentro das características dos demais veículos que estavam por ali”.    

O carro se retirou e surgiu outro carro, cinza escuro que ficou dando voltas nas proximidades da rádio. “Naquele momento, com aquele tiroteio todo, ninguém estava circulando por ali, já era 01h20 da manhã mais ou menos. Então nós entendemos que poderiam ser criminosos”, afirmou. 

Os jornalistas ficaram retidos dentro da rádio, até cerca de 3h da manhã, quando se sentiram seguros para sair. “Recebemos vídeos dos criminosos saindo de Criciúma, como se fosse uma caravana, eram dez veículos que estavam na região central da cidade”, relembrou.

Durante o caminho para casa, Dante conta que não encontrei “absolutamente ninguém” na rua. 

“Estava todo mundo escondido, a polícia também não havia saído ainda. A polícia Militar não provocou qualquer tipo de confronto, porque é uma região de edifícios residenciais e havia muitos explosivos e alguns detonadores que depois a polícia acabou encontrando em locais específicos para o caso de um confronto com a polícia”.

Apesar do desespero da situação, o jornalista ressalta que “ficou a frustração de não poder continuar transmitindo”. 

“A situação vivida por nós ali na rádio foi difícil, porque apesar de estarmos a 150, 200 metros do Batalhão da Polícia Militar, sabíamos que o batalhão tinha sido atacado e do mezanino da emissora víamos as chamas do caminhão que eles colocaram na porta do Batalhão. Então foi uma atuação audaciosa dos criminosos que aos poucos estão sendo presos pela polícia de São Paulo, de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul”

Repercussão 

Para Dante Bragatto, a cobertura demonstrou o papel do rádio em situações de pressão.  “É impressionante a força do rádio, tenho 60 anos de idade e 43 anos de profissão, mais uma vez eu pude constatar e principalmente agora nessa situação, a importância do rádio na vida das pessoas”.

“Temos uma programação muito direcionada a informação e é impressionante que quando nós interrompemos a transmissão o telefone não parou de tocar. Não comentei absolutamente nada do que estava acontecendo no ar. Não tínhamos noção que tinha tanta gente nos ouvindo, não paramos de receber telefonemas e mensagens das pessoas querendo saber o que tinha acontecido, se nós estávamos bem. Pessoas inclusive de outras cidades, dos Estados Unidos, que estavam nos ouvindo pelo aplicativo”, revelou.

Mesmo sem saber das ameaças de invasão, os ouvintes imaginaram que alguma coisa podia estar acontecendo na emissora. A transmissão da Rádio Eldorado levou informação para as pessoas que não estavam na área central de Criciúma, mas que mesmo longe, conseguiram ouvir os tiros e o barulho das explosões do cofre da Agência do Banco do Brasil. 

“Estranharam porque não tinha sirene de polícia. Claro, a polícia estava impedida de sair e recebeu também a determinação do seu comando de que não deveria sair da sede do Batalhão para evitar um confronto armado no centro da cidade. Porque pelo tipo de armas que os criminosos estavam usando, inclusive bazucas, tinham uma Ponto 50, que é uma arma para derrubar avião…”. 

Apesar do susto não houve nenhuma morte durante a ação dos criminosos, porém, Criciúma ainda convive com o medo.  “A cidade ainda está muito assustada, muitas pessoas não querem nem sair na rua, isso que nós estamos aqui a praticamente uma semana do ocorrido”, declarou Dante Bragatto Neto.

Desdobramentos do caso 

Até o momento o já foram detidos doze suspeitos de participar do maior assalto da história de Criciúma. Na quarta-feira (2), uma mulher foi encontrada em uma casa em São Paulo e três homens foram presos entre a divisa de Torres (RS) e Passo de Torres (SC) e dois homens foram encontrados em um viaduto da BR-116 em São Leopoldo (RS).

Na madrugada de quinta-feira (3), um homem foi detido em uma casa na cidade de Três Cachoeiras (RS). No mesmo dia a polícia prendeu dois homens em Gramado, na Serra do Rio Grande do Sul e um casal em Campinas (SP). E na noite de sexta-feira (4), um homem encontrado em pousada de Blumenau (SC).

A polícia já recuperou mais de um milhão de reais do dinheiro roubado. O Banco do Brasil e as forças de segurança não revelaram o valor que foi levado pela quadrilha.

Quando os criminosos fugiram, parte do dinheiro ficou espalhada pelas ruas de Criciúma. Quatro moradores foram detidos após recolherem R$ 810 mil que ficaram jogados no chão por conta da explosão durante o assalto.

Enquanto isso em Goiás…

O secretário de Segurança Pública do Estado de Goiás, Rodney Miranda, revelou que ao longo da semana reuniões entre os secretários estaduais foram realizadas para o compartilhamento de informações de segurança e inteligência para colaborar com as investigações em Santa Catarina e proporcionar a chance de antecipação das forças policiais de outros estados.

“É um crime dificílimo de antecipar. A maioria dos municípios no Brasil são pequenos e médios e costumam ter uma estrutura policial limitada e o reforço costuma demorar a chegar”, explicou. Para o secretário, a resposta rápida, em casos como este, é fundamental para que ações como estas não animem outras organizações criminosas.

Especialistas conceituam esta modalidade de crime como o “Novo Cangaço”. Os criminosos analisam as vulnerabilidades locais, isolam a cidade, anulam as forças policias locais, fazem cidadãos de refém, antes de executar o crime principal. De acordo com a Secretaria de Segurança, Goiás não registra há mais de 18 meses crimes contra bancos ou caixas eletrônicos.

“Eles estão ficando descapitalizados onde eles atuam na origem. Eles estão indo atrás de dinheiro para pagar compromissos de drogas. Nós temos que trabalhar no estrangulamento econômico destas organizações. Desde o ano passado estamos quebrando a espinha dorsal destas quadrilhas”, defendeu.