Estreou nos cinemas da capital essa semana a cinebiografia do astro inglês Elton John. O filme é dirigido por Dexter Fletcher – o mesmo que finalizou o cultuado “Bohemian Rhapsody”, que traz a história da banda Queen, numa franca (fraca?) homenagem a Freddie Mercury.

“Rocketman” também é o nome de uma das mais famosas canções compostas por Elton e seu parceiro musical de longa data, Bernie Taupin, lançada em 1972. No auge da corrida espacial, com várias Missões Apollo em evidência, John e Taupin contavam a história de um astronauta em missão, que enxergava a Terra ao longe, pequena, minúscula, e sentia saudades de sua vida comum. Um homem que, a despeito de ser admirado pelo resto da humanidade, sofria por ter que deixar o aconchego da família de lado em prol do trabalho.

A história de “Rocketman” – a música – é baseada em um conto homônimo de Ray Bradbury. E pode servir perfeitamente como pano de fundo para “Rocketman”, o filme: Elton é um cara admirado pelo resto da humanidade, mas sofre com a falta de lugar no mundo, falta de um lar, de um amor verdadeiro e sincero. Um homem em busca de um lar, de uma reconciliação consigo mesmo.

 

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Desde criança, quando ainda era chamado de Reggie Dwight (seu nome de batismo), passou por maus bocados numa família fria, que não tinha o amor como prioridade. A avó talvez fosse a que mais se aproximasse de um acolhimento desejado. E vendo que tinha algum talento como pianista, acabou partindo para a carreira musical – ora voluntariamente, ora sem muita consciência.

Fugindo da pecha de mero retrato documental, o filme prefere explorar a dimensão psicológica do personagem principal. Para tanto, usa e abusa de metáforas visuais e abraça sem rodeios o gênero musical (é, com o pessoal dançando na rua, em cima de carros e tudo mais). Como produtor executivo, o próprio Elton John fez questão de manter intactas passagens delicadas de sua vida como uma tentativa de suicídio, o abuso de álcool e drogas, e os romances homossexuais. Mas para quem procura explicações sobre a origem de canções, parcerias com outros artistas, ou uma linha cronológica bem delimitada, é bom saber que não vai encontrar isso aqui. A proposta é outra.

A direção é competente, escorando-se sempre em planos fechados, travellings ou câmera na mão (aquela mais tremida, acompanhando os personagens, sem ponto fixo) para aproximar o espectador da mente de Elton John. A montagem das músicas ao enredo também funciona muito bem, de modo que as letras complementam harmonicamente a história.

As interpretações pecam vez ou outra ao extrapolar para o caricato – personagens como os pais de John, ou o empresário e ex-amante John Reid frequentemente vestem uma túnica vilanesca que, sabemos, não existe sempre na vida real – mas no geral funcionam bastante.

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Mas quem rouba mesmo a cena é Taron Egerton, o jovem ator que encarna John. Divertido, expressivo, conduz a emoção da cena com o olhar ou uma lágrima estratégica e delicadamente vazada. Consegue trazer a emoção e vibração do astro inglês para cenas introspectivas ou de explosão musical sem apelar para a caricaturização. Um trabalho de reconstituição muito bem feito – inclusive no clipe de “I’m still standing”, no final, num padrão parecido com o que foi feito no show do Live Aid em “Bohemian Rhapsody”.

A referência a “Rocketman” é irônica, porque o astronauta da música não via absolutamente nada de mais em ser um astronauta. Era apenas o trabalho dele cinco dias por semana. E era o que o tornava um cara solitário acima de tudo. Elton John é esse cara. Mas vemos na tela a sua transformação para a literalidade da palavra: um homem-foguete, que levanta multidões. THE Rocket Man. E com esse objetivo, Dexter Fletcher faz um filme ideal para quem quer – mais do que conhecer a história de Elton John – incursionar por essa figura excêntrica e autodestrutiva que ajudou a moldar as bases do rock e pop inglês.