Especialistas falam em avanços na Cúpula da Amazônia, mas conquistas estão aquém do que se esperava

De olho na repercussão da Cúpula da Amazônia, o Sistema Sagres conversou com dois especialistas em meio ambiente para entender um pouco mais sobre os desdobramentos do evento e os principais aspectos discutidos pelos países membros da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA).  

O presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam), o ambientalista Carlos Bocuhy afirma que houve avanços na Cúpula da Amazônia, mas ainda são necessárias regras claras na atuação da OTCA.  

Já a Doutora em Direito Ambiental, Luciane Martins de Araújo, destacou a importância do encontro após um hiato de 14 anos, mas criticou a ausência de pontos chave na Declaração de Belém, como o objetivo de “desmatamento zero” e questões que envolvem, por exemplo, a exploração mineral.  

“Trata-se de uma iniciativa necessária. Um dia a Amazônia teria que ser gerida de forma integrada e de forma supranacional, como um ecossistema único que é, uma gigantesca bacia hidrográfica que se estende dos Andes ao Atlântico sob o domínio territorial de vários países. Essa governança cooperativa tem que ter regras claras, metas e prazos para sua boa gestão. Isso ainda não aconteceu. Temos um sistema de governança integrado proposto, mas que precisa evoluir em políticas públicas concretas “, pontuou o presidente do Proam.  

Balanço 

Presidente do Proam reforça a necessidade de regras claras para a atuação da OTCA – Foto: Estefânia Uchoa/CMADS

Carlos Bocuhy afirma que a realização da Cúpula da Amazônia em Belém foi “positiva pela iniciativa” mas que apresenta lacunas no detalhamento e indecisões em duas grandes agendas: o desmatamento zero e a eliminação da exploração de combustíveis fósseis. O pensamento é compartilhado por Luciane, que condenou a falta de clareza na abordagem das metas de desmatamento e a ausência de qualquer tipo de menção à exploração mineral.  

“Não houve metas objetivas em relação à questão do desmatamento, que deveria ter no documento final – que fala nisso, mas não tem uma proposta concreta dos países se alinharem para poder zerar o desmatamento na floresta amazônica. Eu diria também que faltou uma posição mais clara em relação à extração mineral. O Brasil tem sofrido uma pressão grande da possibilidade de exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas. Os especialistas todos falam do grande dano ambiental que vai acontecer. Infelizmente é a pressão econômica, falando mais forte do que a necessidade ambiental”, pontuou a Doutora Luciane que lamentou ainda a falta de participação e de diálogo com a população e lideranças ambientais como o cacique Raoni durante a Cúpula.  

O desmatamento zero e a exploração de combustíveis fósseis foram considerados os pontos de maior discussão e frustração por parte dos ativistas ambientais, com manifestações públicas por partes de ONG’s como o Greenpeace e a WWF, conforme mostramos em matéria publicada nesta quarta, 9.  

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Cooperação   

Doutora em Direito Ambiental, Luciane Martins afirma que Cúpula foi o primeiro passo – foto: Arquivo Pessoal

Luciane Martins afirma que de uma forma geral, apesar de estar aquém do que se esperava, é possível extrair um balanço positivo da Cúpula da Amazônia.  

“Não foi tudo aquilo que se esperava, mas foi um primeiro passo. Esse diálogo é importante, é uma forma também de pressionar alguns outros países que já se dispuseram a colaborar com o Fundo Amazônia e com outros fundos climáticos para fins de tentar evitar esses problemas em relação ao desmatamento”, concluiu. 

A Organização do Tratado de Cooperação Amazônica reúne líderes dos países signatários: Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela. A última reunião dos membros havia sido realizada há 14 anos, portanto, o presidente do Proam considera que esse encontro era necessário.  

“Novos tempos do Antropoceno exigem avanços civilizatórios como o green deal (acordo verde, em português) que se consolida na Europa. Um pacto verde para gestão das florestas tropicais é necessário e urgente. Não dá mais para procrastinar a proteção das florestas globais, estamos vivendo um estágio avançado nas mudanças climáticas e a proteção das florestas é vital para o planeta em razão de suas funções ecossistêmicas de refrigeração da região do equador, sequestro de carbono e proteção da biodiversidade”, declarou.      

Ao final do encontro de dois dias no norte brasileiro, os países membros da OTCA divulgaram a Declaração de Belém, com 113 pontos consensuais entre os oitos países em prol de avanços em direitos dos povos amazônicos, preservação, desenvolvimento sustentável, entre outros. 

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 13 – Ação Global Contra a Mudança Climática.