Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) revelaram que os níveis de desmatamento do Cerrado bateram recorde em 2022. De acordo com o Sistema Deter (Detecção de Desmatamento em Tempo Real), o Cerrado teve uma área desmatada de 4.091,6 km² de janeiro a julho do ano passado, a maior dos últimos quatro anos.
Em relação ao mesmo período de 2021, houve um aumento de 28,2% e, quando comparado aos primeiros sete meses de 2020, um crescimento de 50%, quando registrou 2.726,1 km². Já no fechamento do ano Deter, entre agosto de 2021 e julho de 2022, o desmatamento no Cerrado foi de 5.426,4 km². Isso representa um acréscimo de 11,5% sobre o penúltimo (4.866,6 km²) e 38,3% sobre o antepenúltimo (3.921,2 km²).
Além disso, 2022 ficou marcado com o segundo pior índice de desmatamento do Cerrado desde que o Deter foi lançado. O ano também registrou os piores números dos últimos três anos. A região do Matopiba, maior fronteira para o crescimento agrícola, foi onde mais se desmatou: Maranhão (1.255,5 km²), Bahia (1.232,0 km²), Tocantins (876,7 km²) e Piauí (691,5 km²).
Vale ressaltar que, além dos estados mencionados, o Cerrado também está presente em Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná, Distrito Federal, Rondônia e Pará, apesar de ser característico do Brasil Central.
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Desmatamento do Cerrado em Goiás
Presente em praticamente todo o território de Goiás, o Cerrado no Estado teve um desmatamento de 984,79 km² em 2022, ocupando a 5ª posição (9,21%) das 13 federações do país onde há o bioma. Ainda conforme o Inpe, o valor corresponde a um crescimento de aproximadamente 7% em relação a 2021 e 34,25% no comparativo com 2020.
De acordo com o levantamento do Inpe, o índice de desmatamento do Cerrado em Goiás registrado em 2022 é o pior desde 2015, quando o Estado teve uma área devastada de 1.235,24 km².
O Cerrado é o segundo maior bioma brasileiro, atrás apenas da Amazônia. É a savana mais biodiversa do planeta e possui uma ampla variação em seus tipos de vegetação.
“Varia desde as formações florestais (Cerradão, Mata Ciliar), formações savânicas (áreas de cerrado típico, com vegetação mais “retorcida”) até tipos de vegetação campestre que, apesar de serem áreas de paisagem mais aberta (sem árvores), são essenciais na manutenção dos serviços ecossistêmicos, como, por exemplo, a regulação do clima e o ciclo da água”, destaca Dhemerson Conciani, membro da equipe MapBiomas e pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), em entrevista ao Sistema Sagres de Comunicação.
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Importância do Cerrado
Segundo o especialista, existe uma frase que diz que “o Cerrado é a caixa-d’água do Brasil”. Isso ressalta a importância do bioma para o ser humano, que, conforme Dhemerson Conciani, é habitado há mais de 11 mil anos e, hoje, abriga mais de 40 milhões de pessoas, quase ¼ da população brasileira.
“Enquanto o Cerrado é o ‘jardim’ dos grandes centros urbanos, ele também é o lar de populações tradicionais e originárias que fazem uso sustentável dos recursos naturais e, por outro lado, tem um papel fundamental na produção de alimentos pela agricultura familiar e no impulsionamento dos indicadores econômicos do Brasil pela expansão do agronegócio e do mercado de commodities. Dada toda essa importância ambiental, social e econômica, o Brasil, enquanto país, precisa desenvolver políticas públicas de inteligência territorial que equalize esses fatores e mantenha a região habitável e produtiva no longo prazo”, ressalta.
Dhemerson Conciani pontua que tais níveis de crescimento do desmatamento do Cerrado são alarmantes, porque vivemos em um período de acirramento da violência no campo. Isso gera como principal causa a disputa e a grilagem de terras para a expansão da agropecuária sobre a vegetação nativa.
Consequências
“As consequências são catastróficas para as populações tradicionais e originárias que habitam essa região há séculos, bem como para seus modos de vida. Do ponto de vista ecológico são áreas com dezenas de espécies nativas por m² sendo substituídas por cultivos com uma única espécie exótica de grão, geralmente asiático, ou de gramíneas africanas para formação de pastagem. Muitas das espécies nativas estão sendo regionalmente extintas antes de mesmo de conhecermos seu potencial econômico e medicinal”, afirma.
A manutenção do Cerrado também é importante para regulação do clima, objetivo defendido pela Agenda 2030 do Pacto Global da ONU. Além disso, Dhemerson Conciani chama a atenção para outro problema ocasionado pelo desmatamento do bioma.
“Além dos efeitos já conhecidos do desmatamento sobre o aumento da temperatura e na diminuição das chuvas, estudos recentes encontraram uma relação direta entre o desmatamento e o surgimento de novas doenças e epidemias – o que deve alterar drasticamente o padrão de vida nos centros urbanos nas próximas décadas”, finaliza.
A Secretaria do Meio Ambiente
A reportagem também entrou em contato com a Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) para obter um posicionamento sobre os números. Em nota, a pasta informou que em Goiás o desmatamento do Cerrado ficou 21% abaixo do nacional, entre os anos estudados pelo Inpe.
Com relação às ações da Semad, a secretaria ainda afirmou que em 2022 foram lavrados 1.360 autos de infração e 863 termos de embargo. Em área desmatada, a pasta também declarou que, entre o período do levantamento, foram autuados 95 mil hectares, o que dá 950 km².
Por fim, o Meio Ambiente de Goiás destacou que, segundo o MapBiomas, o desmatamento em Goiás diminuiu 3%, mas entre 2019 e 2021. Além disso, a secretaria ressaltou que o número de autuações aumentou mais de 80% no período, principalmente com monitoramento remoto por satélites.
Nota da Semad na íntegra:
“Para o período analisado, entre 2021 e 2022, no Estado de Goiás, o desmatamento teve uma variação 21% abaixo da média nacional para o bioma Cerrado.
Além disso, a Semad avançou significativamente nas ações de fiscalização. Somente em 2022, foram lavrados 1.360 autos de infração e 863 termos de embargo. No que tange à área de desmatamento, 95 mil hectares (950 quilômetros quadrados) foram autuados nos anos de 2021 e 2022.
O último relatório do Mapbiomas mostra que houve diminuição de 3% no desmatamento em Goiás entre 2019 e 2021. Com o investimento em insumos e qualificação para a fiscalização, principalmente em relação ao monitoramento remoto por satélites, aumentou-se em mais de 80% o número de autuações nesse período.“
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