A pandemia foi um grande desafio para nossa sociedade, expôs e agravou problemas relacionados à depressão e ansiedade. Os adolescentes que estão em situação de vulnerabilidade social que precisam conciliar o estudo e o trabalho, foram muito afetados, pois viram a vida mudar totalmente em pouquíssimo tempo durante a crise da Covid-19.

A assistente de Marketing, Raquel Almeida, que na época da pandemia era jovem aprendiz e viu a família inteira adoecer ao mesmo tempo.

“Eu trabalhava como aprendiz no RH e logo em seguida meus pais e eu contraímos o vírus. Meu pai foi para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e quase faleceu e minha mãe ficou em casa, mas muito doente. Com isso, eu não tive tempo de sentir a doença, pois precisei cuidar dela, mesmo que também estivesse passando mal. As meninas do psicossocial cuidaram de mim, mesmo de longe. Todos os dias me mandando mensagens e perguntando como minha família estava e se precisamos de alguma coisa”, conta a jovem.

A Raquel conta que o acolhimento e o suporte emocional foram fundamentais em um momento tão desafiador e deram força para ela se reerguer.

“Foi um sentimento de medo, porque no mês que meus pais pegaram a covid-19 tinha muitas mortes, eles foram um milagre! Eu me senti muito acolhida pela equipe e com muita gratidão, pois encontrei apoio e compreensão onde não imaginava que encontraria”, relatou Raquel.

Raquel Almeida é assistente de marketing da Renapsi. Foto: Palloma Rabêllo

Minimizando os danos

Pensando nos desafios com a saúde mental e o bem-estar do jovem trabalhador a Rede Nacional de Aprendizagem, Promoção Social e Integração (Renapsi), adotou medidas como: a antecipação da carga horária para os jovens aprendizes, chat online de escuta humanizada com apoio psicossocial, manutenção do complemento alimentar e apoio assistencial para famílias mais vulneráveis.

A analista psicossocial da Renapsi, Amanda Costa explicou que houve também a utilização ferramentas da educação à distância como: Plataforma de Formação Conectada e participaram do movimento Não Demita, com mais de 4 mil empresas no Brasil, com o objetivo de manter o quadro de funcionários, sem desligamentos.

“A partir do momento que os jovens foram afastados das atividades presenciais tanto do curso, quanto da prática a Renapsi criou uma plataforma de atendimento remoto a nível nacional. Então o jovem poderia acessar a plataforma em que ele faz o curso e ser direcionado para a equipe técnica do psicossocial”, explicou a analista psicossocial.

Relatos dos jovens

As demandas que chegaram dos jovens ao psicossocial são as mais variadas. Amanda destacou a chegada de diversos relatos de situação de vulnerabilidade econômica e adolescentes.

Ela conta que eles vivenciaram um sentimento de forte angústia acompanhada de sintomas característicos de uma crise de pânico, como choro ininterrupto e batimentos cardíacos acelerados.

Amanda Costa é analista psicossocial da Renapsi. Foto: Palloma Rabêllo

“A gente observou um aumento de demandas relacionadas à ansiedade, porque o jovem é muito imediatista. Eles reclamam bastante sobre o tempo perdido, prejuízos nos estudos, e preocupações relacionadas ao Enem. Isso de uma forma geral, fora os casos em que o jovem perdeu familiares. Hoje vemos um reflexo disso em questões emocionais e psicológicas, porque todos nós fomos afetados pela pandemia”, explicou Amanda.

 O acolhimento é fundamental para o acompanhamento integral do jovem, porque é através dele que os casos em que precisamos ter um olhar mais sensível e um acompanhamento mais próximo da família são identificados.

“Através do acompanhamento realizamos, caso necessário, um encaminhamento para a rede socioassistencial, para garantir que esse jovem tenha condições de permanecer no contrato de aprendizagem com uma boa qualidade de vida e bem-estar”, pontua a analista psicossocial.

Cuidados pós-pandemia

Fique atento, pois os cuidados com a saúde mental devem continuar mesmo depois da pandemia. Como é o caso da jovem aprendiz Ana Carolina que se sentiu acolhida depois de procurar o atendimento psicossocial da Renapsi.

“Estava passando por um momento de muita baixa autoestima e falta de vontade de viver, minha gestora percebeu e pediu para conversar com a Amanda do psicossocial. Ela me ajudou muito, me fez compreender o motivo de estar passando, por isso, e o motivo de me afetar tanto. Foi algo transformador e a partir disso eu sinto que minha vida mudou totalmente”, conta Ana Carolina.

A analista psicossocial pontua que conforme os atendimentos vão acontecendo, os jovens começam a notar os benefícios de cuidar da mente e que fazem essas observações para a equipe.

“A gente precisa dessa devolutiva até para saber o que precisa melhorar. Durante os atendimentos eu sempre faço questão de sinalizar a evolução do jovem durante os encontros e conversamos sobre isso. É importante que eles percebam que os frutos vão surgindo aos poucos”, diz.

Saúde psicológica

Raquel Almeida avaliou que o acompanhamento é algo bastante importante. Ela ponderou sobre o equilíbrio para que as áreas da vida estejam em ordem. Para isso, ter qualidade na saúde mental é algo salutar.

“Sem saúde mental é impossível manter as outras áreas da vida em ordem. Se você não tiver um acompanhamento e não fizer uma terapia as coisas tendem a ficar muito difíceis. Depois que eu aprendi a priorizar minha saúde mental tudo melhorou”, frisa a assistente de Marketing.

A saúde mental é algo que pode colaborar para que os demais pontos de vida se complementem.

“Na nossa vida existem vários pilares como, família, saúde física e mental e acredito que cuidar da mente é fundamental, pois se ela não está saudável todas as outras áreas da vida também não estarão”, pontua a jovem aprendiz.

Graduação e pandemia

Foto: Palloma Rabêllo

Outro exemplo de grupo que foi bastante afetado, psicologicamente, é o de jovens que estava em universidades.

Para a personal trainer, Tatiana Silva da Conceição, a pandemia foi um período bem complicado. A jovem estava cursando o mestrado e sentiu a ansiedade aumentar muito.

“A gente não estava frente a frente com o professor e a dificuldade de aprendizagem apareceu. Foi um desastre! Mesmo em meio a tantas questões a gente teve que se adaptar a situação e era tudo muito novo para os professores também. Foi um período muito difícil e que vem afetando muito a gente até hoje. Tudo isso me abalou muito e a minha ansiedade triplicou. Eu tinha que sair para correr, porque eu não aguentava ficar em casa estudando, era muita ansiedade muita preocupação. Foi terrível, mas nós vencemos e a atividade física me ajudou muito”, lembra Tatiana.

O estudante Natan Aguiar estava cursando o ensino médio na época da pandemia, em meio as dificuldades ele não sabia que curso seguir. Foi em meio a crise da Covid-19 que ele descobriu o amor pelo esporte.

Foto: Palloma Rabêllo

“Eu estava em dúvida em qual curso prestar no vestibular, precisei pesquisar muito sobre atividade física, e como adaptar para fazer em casa, pois todas as academias estavam fechadas. Naquele momento a única coisa que melhorava a minha ansiedade era me movimentar e foi assim que eu descobri o que queria fazer da minha vida e assim escolhi que curso prestar”, contou Natan.

Atividade física e saúde mental 

A pandemia foi um período conturbado na vida de todos nós, pois durante esse momento tivemos que lidar com muita coisa ao mesmo tempo. Alguns foram mais afetados que outros! Mas tem algo em comum entre os relatos da Tatiana e do Natan, a atividade física usada como ferramenta para melhorar a saúde mental.

“Tanto a musculação quanto os exercícios aeróbios me ajudaram bastante. Acredito que todo mundo deve ter uma válvula de escape nesse sentido e fazer algo que goste. Os exercícios me ajudaram muito. Além disso, eu fiz psicoterapia com uma psicóloga, cuidei do meu corpo, da minha mente e da alimentação. É importante lembrar que a saúde é vista de uma forma integrada”, afirma Natan.

Estudo realizado pela FEFD

Uma das diversas preocupações estava relacionada com o sofrimento psíquico dos estudantes. Por isso, a Faculdade de Educação Física e Dança (FEFD) da Universidade Federal de Goiás (UFG), realizou um estudo que avaliou 218 estudantes de graduação, por meio de questionários para coletar informações como a exposição deles ao vírus, nível de atividades físicas, medo do vírus e sintomas de depressão e ansiedade.

Segundo o coordenador do estudo e professor da UFG, Claúdio Lira, o estudo teve o objetivo de investigar o medo da Covid-19 e os níveis de ansiedade e depressão e correlacionar todas essas variáveis medidas sociodemográficas. Por exemplo, as atividades de restrição do isolamento social, os níveis de atividade física, e se a pessoa teve perda de algum familiar durante a pandemia por conta da Covid-19.  

“É importante ressaltar que esse estudo foi realizado durante o ensino remoto, quando nós estávamos prestes a voltar para o ensino presencial. Então, investigar todas essas variáveis deu uma resposta bastante interessante para as universidades referentes as medidas que podem ser tomadas e principalmente aos sintomas psiquiátricos”, explica o professor.

Foto: Palloma Rabêllo

Dados do estudo mostram que os alunos da graduação apresentaram alta prevalência de depressão e ansiedade (83,0% entre mulheres e 76,1%, entre os homens), mas baixa prevalência de medo de Covid-19 (28,9%), durante as aulas remotas.

“Nós também mostramos que aqueles estudantes que tiveram perda na família, por conta da pandemia, apresentavam o maior medo da covid-19. Tudo isso, foi correlacionado com o nível de inatividade física, mostrando que de fato o exercício físico regular é uma ferramenta não farmacológica importante para o gerenciamento de ansiedade e depressão”, conta Cláudio.

Criar açoes

Para o professor esse tipo de estudo pode ser usado para criar ações de gerenciamento de sintomas de ansiedade e depressão entre os alunos.

“Os resultados podem ser usados pelos diretores, professores e reitores das diferentes universidades públicas brasileiras, para programas de combate, gerenciamento e assistência para os estudantes universitários. A literatura mostra que sintomas de ansiedade e depressão, para além do sofrimento psíquico, estão relacionados também com baixo rendimento acadêmico. Isso é algo que as universidades precisam se apropriar para ajudar essa população”, finalizou.

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